2º Domingo da Quaresma

“Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutai o que ele diz!”
Lucas 9,28-36

O nosso texto de hoje vem logo após o diálogo com Pedro e os discípulos, na estrada de Cesareia de Filipe, a respeito de quem era Jesus e como deveria ser seu seguimento: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome cada dia a sua cruz e me siga” (Lucas 9,23). Começando a passagem com as palavras: “Oito dias após dizer essas palavras”, Lucas quer ligar estreitamente o texto com a mensagem anterior, sobre o seguimento de Jesus até a cruz. É notável também que os três discípulos que Ele levou consigo são os mesmos que o acompanhariam no Jardim de Getsêmani (Mateus 26,37).

O texto destaca um aspecto de Jesus que é muito caro a Lucas: Ele era um homem de oração. Nesse momento, Ele “subiu à montanha para rezar” (vers. 28). Durante a oração, aparecem Moisés e Elias, símbolos da Lei e dos Profetas, duas das figuras mais importantes do Antigo Testamento. Assim, Lucas mostra que Jesus está em continuidade com as Escrituras, isto é, o caminho que Jesus segue está de acordo com a vontade de Deus. Os dois personagens, tanto Moisés como Elias, eram profetas rejeitados e perseguidos em seu tempo. Lucas aqui vislumbra o destino de Jesus, de ser rejeitado, mas também de ser vindicado por Deus.

Pedro, ao despertar do sono, faz uma sugestão descabida: “Mestre, é bom ficarmos aqui. Vamos fazer três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias” (vers. 33). Claro, era bom ficar ali, em um momento místico, longe do dia a dia, da caminhada, das dúvidas, dos desentendimentos, da luta. Quem não o quereria? Mas não era uma sugestão que Jesus pudesse aceitar. Terminado o momento de revelação, “Jesus estava sozinho” e, no dia seguinte, “desceram da montanha” (vers. 37). Por tão gostoso que fosse ficar no Monte Tabor, seria preciso descer para enfrentar o caminho até o Monte Calvário. A experiência da Transfiguração está intimamente ligada com a experiência da Cruz. Quem sabe, a experiência do Tabor tenha dado a Jesus a coragem necessária para aguentar a experiência bem dolorida do Calvário?

Aplicando o texto e a sua mensagem a todos os cristãos, podemos deduzir que todos precisam subir o Monte Tabor para serem transfigurados, para depois descerem para “lavar os pés” dos irmãos e irmãs. Todos nós, seja qual for nossa vocação, precisamos de momentos de oração profunda, de união especial com Deus. Isso se torna cada vez mais importante no mundo atual, de ritmo quase frenético, de estresse e correria. Temos de descobrir como criar tempo para respirarmos mais profundamente a presença de Deus, para renovarmos nossas forças e nosso ânimo. Essas experiências não devem ser “intimistas”; pelo contrário, devem aprofundar nossa fé e nosso seguimento, para podermos seguir o exemplo daquele que lavou os pés dos discípulos: “Eu, que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros” (João 13,14).

Esse trecho pode nos ensinar a valorizar os momentos de “Tabor”, os instantes de paz, de reflexão, de oração. Pois, se formos coerentes com nossa fé, teremos muitas vezes de fazer a experiência de “Calvário”. Somos fracos demais para aguentar essa experiência contando somente com nossas próprias forças e recursos. Por isso, busquemos forças na oração, na Palavra de Deus, na meditação sempre, para que possamos retomar o caminho, como fizeram Jesus e os três discípulos. Para os momentos de dúvida e dificuldade, o texto nos traz o conselho melhor possível, através da voz que saiu da nuvem: “Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutem o que ele diz!” (vers. 35). Façamos isso e venceremos nossos calvários.

Padre Tomaz Hughes, SVD, biblista e assessor da CRB e do Cebi. Dedicou-se a cursos e retiros bíblicos em todo o Brasil. Publicou diversos artigos e o livro “Paulo de Tarso: discípulo-missionário de Jesus”. Faleceu em 15 de maio de 2017. Suas reflexões bíblicas são muito atuais.

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