Data criada mais para afagar o comércio, o Dia dos Namorados é celebrado, no Brasil, em 12 de junho, véspera da memória de Santo Antônio de Pádua, o famoso “casamenteiro”. Essa, entretanto, também pode ser uma ótima ocasião de avaliar como nós, cristãos e cristãs, estamos lidando com os casais apaixonados de todas as idades. Adianto: há muito a ser revisto por nós, na vida pastoral, social e familiar.
Antes de escrever estas linhas, eu tinha o desejo de dar algumas dicas para os que se preparam para o matrimônio. Elas seriam baseadas em minhas experiências pessoais e de meu ministério de diácono na Arquidiocese de Belo Horizonte. Bem a tempo, dei-me conta de estar caindo na soberba. Melhor mesmo, para quase todos nós, seria suplicar a reconciliação com os próprios casais.
Muitas de nossas comunidades de fé têm dívidas importantes com os namorados. Quantos já não tomaram uma bronca simplesmente por estarem de mãos dadas durante alguma liturgia ou circularem abraçados dentro de algumas de nossas instituições? A rispidez costuma vir de um moralismo sem fundamento, sem Evangelho, disfarçado de “zelo pela casa de Deus”.
O amor dos namorados sacramentaliza, sim, o afeto de Deus pela humanidade. Em inúmeras passagens da Bíblia, o noivo é alegoria de Deus Pai ou de Cristo, a depender do contexto. A noiva, ora exuberante, ora anônima, ora pecadora a ser perdoada, é figura do povo, da Igreja. A celebração do matrimônio expõe, diante de nossos olhos, o mistério (sacramento) do Senhor que se derrete de amores por sua amada, antecipa-se e vai ao encontro dela no caminho (no corredor da igreja). Admirado por sua beleza, Ele a beija e firma com ela uma aliança. Para quem ainda não o fez, sugiro meditar, nessa ótica, o Cântico dos Cânticos. Assim, será fácil compreender o motivo de esse ser um dos principais textos de mística da história.
Namorados, perdoem-nos por, muitas vezes, nós nos esquecermos de vocês em nossas comunidades de fé! Vocês costumam ser colocados de lado até na programação da Semana da Família, imaginem! No Dia dos Namorados, falamos mais contra o comércio aproveitador do que bendizemos a Deus pelo amor de vocês! Relevem nossa negligência, ao privá-los de espaço e tempo para ouvi-los e apoiá-los quando sofrem pelos desafios típicos desse tempo, como as discussões, as dúvidas, as fraquezas. Como perdemos em não lhes preparar um lugar digno em nossas paróquias, para saborearem juntos um sorvete. Queridos, lamentamos pelo descuido com vocês em tantos de nossos encontros vocacionais! Uma lástima! Como ainda temos coragem de falar de uma família cristã sólida sem um olhar carinhoso a vocês? Tenham misericórdia de nós!
Nossas famílias também precisam (re)ver como lidam com os relacionamentos de seus filhos. Algumas se omitem, nem querendo saber com quem os seus estão saindo. Outras, por ciúmes ou superproteção, impedem ou embaraçam o desejo de seus filhos e filhas encontrarem a pessoa amada e com esta constituírem uma família. Quantos lares deixaram de surgir por isso! Também existem pais, mães e toda uma sociedade a forçar uma vocação matrimonial inexistente em alguns jovens, levando-os a uma vida de desventura. Uma pena!
Vivemos tempos de culto idolátrico (inclusive por parte de “cristãos”) ao poder, à morte, à fome, ao “mercado”, às armas, à guerra. Assim, queridos casais apaixonados, precisamos muito de vocês! Clamamos por seu testemunho de beijos, abraços, conversas longas, ternas e “bobas”! Não se assustem com “D.R.” (no idioma namorês, “discutir a relação”), pois elas são normais na vida, quanto mais nesse tempo de discernimento. Ignorem os que confundem “namoro santo” com amor sem carícias. Quem inventou isso nunca namorou! Posso lhes garantir! Evitem o jejum de afeto!
Apesar de tudo, não desanimem! Sejam muitíssimo bem acolhidos, bem-vindos em nossas comunidades de fé, em nossos encontros vocacionais, em nossos centros de apoio e pátios. Mesmo penitentes, ousamos abençoá-los. Louvado seja Deus por vocês!
Dedico este texto a Tânia, minha namorada, com quem orgulhosamente sou casado (também, sim, temos nossas “D.R.”!). Obrigado por tudo! Eu te amo!
Alessandro Faleiro Marques
Diácono permanente na Arquidiocese de Belo Horizonte, professor, editor de textos para as irmãs missionárias servas do Espírito Santo, membro da Equipe de Espiritualidade da Província Brasil Norte das SSpS.