Estamos sob os impactos que o coronavírus trouxe. O mal atingiu todo mundo e o mundo todo. Ninguém, com o mínimo de sanidade, desejou que esse vírus aparecesse. Contudo a realidade está aí, e todos estamos envolvidos nesta tragédia, por um lado, mas também em grandes oportunidades, por outro.
Ninguém ignora o mal que o vírus causou e está causando, mas ele nos obrigou a revermos muitas coisas em nossa vida. Descobrimos o quanto somos criativos para nos livrar de alguns efeitos deletérios que ele causou. Vejam-se, por exemplo, quantos gestos de solidariedade ocorreram. Quantas formas novas de comunicação e entreajuda! O vírus obrigou os governos a repensarem muito de suas políticas e projetos. Em nível de educação, com os alunos em casa, fazendo suas lições e descobrindo suas próprias capacidades, antes ignoradas ou pouco usadas.
Deu oportunidade para cada um encontrar maneiras novas para preencher seu tempo. Em nível de convivência familiar, quantas vivências novas os pais fizeram estando com os filhos! Quantas renúncias tivemos de fazer e, apesar disso, continuamos vivos! Muitas coisas supérfluas, das quais antes não se abria mão, agora se vive sem elas, numa boa, como se diz. Em nível de relacionamentos, quantos jeitos novos de se comunicar e uma nova percepção da importância dos outros em nossa vida! Todos aprendemos que somos dependentes uns dos outros. Sentimos falta das pessoas mais próximas, com as quais ficamos temporariamente sem encontrar pessoalmente, mas nem por isso deixaram de participar e ser importantes para nós.
O vírus nos obrigou a olhar para os rumos que a vida estava seguindo! Todos estamos fazendo uma experiência inédita; ninguém havia passado por isso. Todos sofremos com as ausências de tantas coisas que antes faziam parte de nosso cotidiano. Sair à hora que se quisesse, sem preocupação de se ter uma máscara em mãos; de ir ao supermercado sem ninguém à porta orientando as entradas; de comprar nas lojas sem observar distanciamentos. De ir às igrejas e participar das celebrações. Quantas pessoas estão com saudades desses encontros da fé celebrada na comunidade cristã! Tudo isso nos diz que estamos num tempo diferente, não somos mais livres para fazer como antes. Agora somos obrigados a obedecer a condutas novas.
O vírus virou o mundo de ponta-cabeça! Quer queiramos ou não, ele afetou o modo de viver de muitas maneiras. No aspecto econômico, tivemos de repensar como gastar o dinheiro. Aliás, quanta luta e desespero de muita gente para sobreviver, para conseguir os benefícios oferecidos pelo governo! Apesar do drama humano vivido por tantos, ficamos surpresos e indignados com a maldade de muitos que se aproveitam para enganar, roubar, fazer falcatruas para se beneficiar em cima do sofrimento alheio. Tivemos notícias de gente usando de artimanhas para se aproveitar do alheio, falsificando documentos, desviando recursos, superfaturando compras de respiradores, medicamentos, obras de emergência.
O vírus está revelando as duas faces humanas. Uma da solidariedade e do compromisso com a vida e com a dor e sofrimento das pessoas; a outra, da maldade, que explora e aumenta o sofrimento sobretudo dos mais carentes. Eis uma oportunidade de as pessoas mostrarem se têm ou não caráter, se são do bem ou do mal, se são ou não humanas!
Ninguém vai sair dessa experiência igual ao que era antes. Todos fomos afetados por ela. Depois que ela passar, vamos medir melhor as consequências as quais agora ainda não sabemos avaliar. A grande maioria espera que o mundo seja diferente. Para melhor ou pior? Ainda não sabemos, tomara que seja para melhor! Aliás, esse desejo está presente naqueles que já se convenceram de que vão ser diferentes, porque aprenderam, com a experiência, aquilo que é essencial à vida e aquilo que é relativo. Nesse sentido o vírus nos trouxe uma oportunidade de viver de um modo diferente, mais solidário e mais humano.
Pensando bem, então, apesar do mal que o coronavírus provocou, trouxe também algum bem. Às vezes, é preciso que a morte nos ameace para aprendermos a cuidar melhor da vida! É preciso que alguém morra para se dar o valor que a vida tem. A “morte e ressurreição” continuam indicando o “caminho” e as opções que cada um pode escolher. Ninguém sai neutro desta pandemia. Se assim é, então aproveitemos a oportunidade de novos aprendizados, permitindo que a vida continue com um sentido mais profundo nos novos horizontes que estão se abrindo.
Pe. Deolino Pedro Baldissera, SDS
Padre salvatoriano há 43 anos, professor e psicólogo pela Universidade Gregoriana de Roma, com mestrado em Psicologia e doutorado em Ciências da Religião. Atualmente é pároco em Videira-SC.