Cristo é a nossa paz

Em 17 de fevereiro, Quarta-Feira de Cinzas, iniciamos a Quaresma. Também nesse dia, em todo o Brasil, abrimos a Campanha da Fraternidade (CF) que, neste ano, tem como tema “Fraternidade e diálogo: compromisso de amor” e o lema “Cristo é a nossa paz: do que era dividido fez uma unidade” (Ef 2,14a). Esta CF nos convoca a todos para a construção de um mundo no qual reine a paz verdadeira, que nasce como fruto do diálogo e do compromisso de amor.

O tema vem de encontro a um mundo dividido por ideologias, ódios, injustiças sistêmicas, notícias falsas (fake news) que perturbam a paz e a convivência pacífica entre pessoas e povos. Nosso mundo, que está marcado pela pandemia, a qual já trouxe tanto sofrimento a milhões de pessoas, precisa de paz e solidariedade para superar os males causados pelas doenças e para a construção de uma nova humanidade. A tarefa de superar as divisões e os males precisa ser assumida por todas as pessoas de boa vontade, pelos governantes das nações e por todos aqueles que têm responsabilidades que afetam o espírito de convivência pacífica e ordeira.

A verdadeira paz é fruto do protagonismo do Evangelho que nos ensina que todos somos irmãos, mesmo que nascidos de pais biológicos diferentes. A imagem e semelhança colocada em nós pelo próprio Deus é fonte e certeza de que é possível uma vida mais humana, mais esperançosa e menos conflitiva. Nossas esperanças se voltam para todos os que podem contribuir com seu testemunho, deixando de lado toda desavença e disputa.

A experiência da pandemia nos mostrou que todos somos frágeis e precisamos uns dos outros. Para superar esse mal, nossa esperança se volta para as vacinas que começam a ser injetadas em defesa do organismo, para combater o vírus. É uma luz diante do caos vivido por um ano inteiro. Superar, contudo, a pandemia é um dos desafios que nos afligem. A CF nos encoraja a superar todo tipo de divisão e a estabelecer novos modos de convivência que vençam tantos outros males que vão além da pandemia. A campanha nos propõe uma constante conversão como processo permanente. Ela nos pergunta “sobre como nos envolvemos com as transformações sociais, econômicas, espirituais, ecológicas, individuais e coletivas, a fim de que sejamos cada vez mais coerentes com os ensinamentos de Jesus nos evangelhos”. E prossegue dizendo: “Jesus nunca orientou seus discípulos e discípulas a criarem inimizades e perseguirem outras pessoas em seu nome”.

A Quaresmo é um tempo de conversão. São 40 dias em que somos convidados à prática da oração, do jejum, da partilha do pão. “Viver um jejum que agrade a Deus e que conduza à superação de todas as formas de intolerância, violências e preconceitos.”

O Tempo de Quaresma, de modo particular neste ano, incentiva-nos, nas palavras do poema de D. Pedro Casaldáliga, a viver a paz inquieta: “Dá-nos, Senhor, aquela paz inquieta que denuncia a paz dos cemitérios e a paz dos lucros fartos. Dá-nos a paz que luta pela paz! A paz que nos sacode com a urgência do Reino. A paz que invade, com o vento do Espírito, a rotina e o medo, o sossego das praias e a oração de refúgio. A paz das armas rotas na derrota das armas. A paz do pão da fome da justiça, a paz da liberdade conquistada, a paz que se faz ‘nossa’, sem cercas nem fronteiras. Que tanto o ‘shalon’ como ‘salam’, perdão, retorno, abraço… Dá-nos a tua Paz, essa paz marginal que soletra em Belém e agoniza na Cruz, e triunfa na Páscoa. Dá-nos aquela paz inquieta, que não nos deixa em paz!”

Como no caminho de Emaús, no diálogo entre os dois discípulos e o desconhecido os levou a ter uma nova compreensão dos fatos, nós também somos convidados a descobrir, em nossa história, a história de salvação que Cristo vem operar aos que aceitam trilhar os caminhos por Ele proposto, numa visão nova de comunhão que vence os medos e nos torna anunciadores da realidade inaugurada pela Ressurreição de Cristo. Só com Ele, superaremos as visões distorcidas da história e encontraremos o caminho de volta ao convívio alegre com os irmãos de caminhada. Que a paz de Cristo habite em nós e em nosso mundo. É com esse espírito que queremos iniciar a Quaresma e a Campanha da Fraternidade de 2021.

Pe. Deolino Pedro Baldissera, SDS
Padre salvatoriano há 43 anos, professor e psicólogo pela Universidade Gregoriana de Roma, com mestrado em Psicologia e doutorado em Ciências da Religião. Atualmente é pároco em Videira-SC.

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