Belém do Pará foi palco dos Diálogos Amazônicos, da Cúpula dos Povos Indígenas e da Cúpula da Amazônia. Entre outros resultados, foram produzidos documentos como a “Declaração de Belém”.
Os diálogos amazônicos ocorreram entre 4 e 6 de agosto e antecederam a Cúpula da Amazônia. Reportagem de Cícero Pedrosa apurou que os debates sinalizaram a contribuição dos povos indígenas e das comunidades tradicionais para a proteção do território e a conservação da floresta.
Valorizaram também os conhecimentos ancestrais para a manutenção da biodiversidade. Os produtos e serviços da sociobiodiversidade e a forma de produção das comunidades tradicionais foram considerados como importantes para o fomento de economias locais sem comprometer os ecossistemas.
O repórter criticou, no entanto, a prevalência da visão da Amazônia como repositório de recursos e a ausência do reconhecimento mais enfático da participação dos povos originários assim como das comunidades tradicionais.
O mesmo repórter relatou que, no segundo dia dos Diálogos Amazônicos, ocorreu um evento separado com 600 participantes: a Cúpula dos Povos Indígenas.
A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) contribuiu com a estruturação do encontro, e seu representante destacou o simbolismo em excluir os principais conhecedores das florestas dos Diálogos Amazônicos e da Cúpula da Amazônia.
Cícero apontou que os resultados da Cúpula dos Povos Indígenas vislumbram a Amazônia em um futuro com terras demarcadas, livre do garimpo, das hidrelétricas, da agricultura industrial, das ferrovias e de outros projetos dessa natureza. Foram criticadas intenções como a exploração de petróleo, o crédito de carbono e a bioeconomia, e foi reafirmada a luta pela demarcação dos territórios.
Algumas questões criticadas pela Cúpula dos Povos Indígenas estiveram em pauta na Cúpula da Amazônia, que ocorreu entre os dias 8 e 9 de agosto, contando com representações de oito países vinculados ao bioma amazônico e a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). Os países representados foram Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela. O encontro visou a debater assuntos relevantes para a manutenção da Floresta Amazônica espalhada pelos territórios desses países.
Da Cúpula resultou a agenda conjunta aos países denominada “Declaração de Belém”. O documento destacou como pontos principais:
- princípios transversais de proteção dos direitos humanos;
- cooperação regional para evitar o ponto de não retorno na Amazônia;
- aliança para o desmatamento zero até 2030;
- cooperação entre as polícias dos países;
- combate, com sistema integrado de controle, ao tráfego aéreo ilícito;
- atuação conjunta dos bancos para o desenvolvimento sustentável da região;
- mecanismos de participação de povos indígenas nas agendas e discussões;
- ações e observatórios voltados para a defesa dos direitos humanos, do meio ambiente e das cidades amazônicas;
- fomento da inovação e difusão tecnológica para o desenvolvimento regional sustentável.
As decisões envolveram 18 temas desdobrados em 113 itens. Autores consultados não isentam nem o evento, nem o documento de críticas. Os temas mais polêmicos são a ausência de menções ou sanções à exploração de petróleo; a origem de recursos e de medidas concretas em longo prazo. Por outro lado, a Cúpula e a Declaração foram consideradas importantes estratégias de preparação para a Conferência do Clima das Nações Unidas (COP-30), prevista para ser realizada em Belém do Pará, em 2025.
Os eventos do Pará e a votação do marco temporal (em curso) estão profundamente conectados quando consideramos os biomas, os territórios e a natureza para além de repositório de recursos transformáveis em artefatos artificiais alienantes da experiência humana em meio natural.
As consequências da aprovação do marco temporal foram abordadas com muita clareza por Cícero Pedrosa, Carlos Marés, Felipe Milanez: restringindo o reconhecimento de terras indígenas ao ano da promulgação da atual Constituição (1988), famílias estarão em situação de vulnerabilidade, e nosso planeta também.
Carlos menciona estudo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, estimando que a aprovação do marco pode resultar no desmatamento de até 550 mil quilômetros quadrados de áreas nativas, ampliando a emissão de carbono e afetando um sistema, hoje considerado de captura de carbono, mas já afetado pelas mudanças climáticas, de acordo com a ONU.
Refletir acerca dessas importantes questões atende aos princípios da equipe de comunicação da Rede SSpS Brasil, que considera acompanhar, debater e atuar sobre o que acontece à nossa volta como parte da missão. Também está em conformidade com a plataforma Ação Laudato si’ e com o apelo do Papa Francisco para o cuidado da nossa casa comum.
Referências Nota: foram realizadas várias leituras, incluindo textos disponibilizados por: Instituto Humanitas Unisinos (https://www.ihu.unisinos.br/) Declaração de Belém - disponível no Portal do Ministério das Relações Exteriores (https://www.gov.br/planalto/pt-br/assuntos/cupula-da-amazonia/documentos-da-cupula) Justino Sarmento Resende - antropólogo, padre e indígena em entrevista para o IHU (https://www.ihu.unisinos.br/categorias/188-noticias-2018/584953-cosmovisao-indigena-criacao-encarnacao-e-saida-desse-mundo) Cícero Pedrosa - Repórter para o Portal Amazônia Real (https://amazoniareal.com.br/cupula-dos-povos-indigenas/) Tainá Aragão - Jornalista do Instituto Socioambiental - ISA (https://www.socioambiental.org/noticias-socioambientais/dialogos-amazonicos-colocaram-sociobiodiversidade-no-centro-do-debate-para) Felipe Milanez - Jornalista para Carta Capital (https://www.ihu.unisinos.br/570680-marco-temporal-um-argumento-racista-para-legitimar-massacres) Carlos Marés - Professor de Direito Socioambiental para Revista Pub (https://www.ihu.unisinos.br/categorias/610997-marco-temporal-marca-do-atraso) Carta Encíclica Laudato si’ do Santo Padre Francisco sobre o Cuidado da Casa Comum (https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html) Plataforma de Ação Laudato si’ (https://plataformadeacaolaudatosi.org/objetivos-laudato-si/) Nações Unidas Brasil (https://brasil.un.org/pt-br/137094-decl%C3%ADnio-na-captura-de-carbono-na-amaz%C3%B4nia-%C3%A9-abordado-por-ag%C3%AAncia-da-onu-em-estudo)
Marli Teresinha Everling
Professora dos cursos de Graduação e Pós-graduação em Design da Universidade da Região de Joinville (Univille); coordenadora do Projeto Ethos – Design e relações de uso em contexto de crise ecológica; colaboradora do Instituto Caranguejo de Educação Ambiental (caranguejo.org.br); colaboradora do blog SSpS Brasil para temas ambientais (https://blog.ssps.org.br/posts); colaboradora das redes sociais do design para temas ambientais – Instagram @designuniville