O dia das mulheres sem dúvida é uma data memorável para todos nós, para lembrar da força das mulheres e de toda sua conquista na sociedade ao longo dos anos.
E o que mais nos chama a atenção no ser feminino, é que, ao mesmo tempo que possui uma lado carinhoso e delicado, ele também possui um lado forte e virtuoso. Essas incríveis qualidades, infelizmente, não são do conhecimento de muitas mulheres, ou até são, porém existe o medo do despertar desta força.
Nossa Ir. Cecília Hansen, que durante 17 anos trabalhou com os grupos de mulheres nas periferias de São Paulo, conta como foi sua vivência de acompanhar, aconselhar e encorajar as mulheres. Baseada em suas experiências, ela afirma que “a mulher precisa tomar consciência do seu papel na sociedade e na Igreja”.
Experiência com o Grupo de Mulheres
“Na década de 1970, pós Concílio Vaticano II, D. Paulo Evaristo Arns fez um apelo às Congregações para liberar irmãs para a periferia. Esse chamado veio ao encontro do meu desejo de trabalhar com os (as) empobrecidos (as).
Em 1972 iniciei meu trabalho em Vila Remo – periferia da Região Sul de São Paulo. Os Padres me convidaram para conhecer e ver a realidade e lá fiquei 17 anos.
Naquela época, Vila Remo era uma periferia no extremo da cidade. Tudo faltava. Não tinha água encanada, coleta de lixo, faltava escolas, creches, transporte, etc.
A maioria do povo vinha do Nordeste e do Interior de Minas, desenraizada de sua família, cultura e ambiente em busca de melhores condições de vida.
Iniciamos o nosso trabalho formando Comunidades Eclesiais de Base. Era uma nova forma de viver a Igreja. Era uma Igreja circular onde todos (as) tinham voz e vez. Cada participante tinha o seu papel: padre, religiosa, leigo e leiga. Trabalhávamos em equipe (em redes). O trabalho foi distribuído. Todos tinham um compromisso com as CEBS – Comunidade Eclesiais de Base. Eu, pessoalmente, além das CEBS, me dedicava mais à catequese, aos Grupos de Mulheres e ao Movimento do Custo de Vida.
A Palavra de Deus nos inspirava e sustentava nossa espiritualidade. Era uma releitura da Bíblia a partir do oprimido, era uma espiritualidade encarnada na Palavra de Deus e na vida – na linha do CEBI (Centro de Estudos Bíblicos)”.
Clube das Mães
“Sendo uma Igreja onde todos (as) tinham voz e vez, o povo trazia para as nossas celebrações e encontros seus problemas, suas dificuldades, suas necessidades, suas angústias, suas esperanças. Formaram-se vários grupos conforme as suas necessidades. Assim, também as mulheres se organizaram em grupos. Todas as comunidades nos bairros tinham um grupo de mulheres que naquela época se chamava ‘Clube de Mães’.
Formaram uma coordenação com representantes de cada Clube de Mães. O grupo escolhia a sua representante. A coordenação se reunia uma vez por mês e cada uma trazia a dinâmica e a vida do seu grupo e levava as propostas da coordenação para o seu grupo de volta. Queríamos a participação de todas as mulheres. Só assim se decidia sobre um assunto ou sobre uma ação assumida por todas.
As mulheres sentiram mais que ninguém o sofrimento da situação. Tomaram iniciativas por vários movimentos sociais como: Movimento por creches, escolas, água encanada, transporte, etc. Um movimento que se destacava e se espalhava pela cidade e por todo país era o ‘Movimento do Custo de Vida’.
Não conseguimos resultados concretos das nossas reivindicações, mas houve um grande salto na consciência das mulheres. Saíram das quatro paredes de suas casas e começaram a enxergar outras possibilidades na vida. Assumiram seu papel na Igreja e na sociedade”.
Centro Sofia de Solidariedade
“Passei um tempo em Goiânia e São Luiz de Maranhão. Voltei em 1995 para São Paulo. Houve muitas mudanças na Igreja e na sociedade.
Com a mudança da Igreja de São Paulo, o espaço para as mulheres foi restringido e, às vezes, elas foram excluídas. Muitas mulheres sentiram a falta de se reunir, trocar ideias e celebrar.
Algumas mulheres se propuseram a se encontrar e convidaram mais mulheres. O Convento Santíssima Trindade nos ofereceu o espaço físico e a infraestrutura. A semente foi lançada e em 1995 o grupo teve início.
O objetivo do grupo era olhar um pouco para nós mesmas, resgatar nossa dignidade, tomar consciência do nosso papel na sociedade e na Igreja, cultivar uma mística, vivenciar uma espiritualidade integrada, cósmica e buscar energias e inspiração para o nosso dia a dia.
Temos sempre um olhar e um pé na realidade. Refletimos, aprofundamos e participamos da Marcha Mundial das Mulheres, Fórum Social Mundial, Campanhas contra a Dívida Externa e Alca, Centenário das SSpS, Romaria à Aparecida do Norte, Pentecostes, canonização do Pe. Arnaldo e a Beatificação de Madre Josefa, etc…
Anualmente avaliamos os nossos encontros. Já trouxeram algum resultado: maior auto-estima, maior consciência do nosso papel, uma nova concepção de mundo, aprendizagem de como lidar com conflitos, conquistas no espaço público, engajamento em projetos sociais.
Todos os encontros se realizavam com dinâmicas participativas, usando técnicas, músicas, danças circulares, exercícios corporais integrando-nos com a natureza e energias do universo, a partir da ótica de relações de gênero e vivenciando uma espiritualidade holística, cósmica. A natureza com o seu encanto fazia sua parte na realização desse bem-estar”.