Etarismo, como combater?

Existe uma idade limite para adquirir conhecimento? Com que idade um indivíduo pode estudar, fazer uma faculdade, aprofundar seus conhecimentos? De uns tempos para cá, é muito comum ver, na educação para jovens e adultos (EJA), senhoras e senhores que, depois da aposentadoria ou de estarem com os filhos já criados, voltam a estudar. Muitos dizem orgulhosamente que retornaram à escola para realizar um sonho. Por que será, então, que, algumas semanas atrás, três jovens estudantes de uma faculdade criaram polêmica com uma colega de curso pelo fato de ela ter mais de 40 anos? O fato é que elas cometeram o chamado “etarismo”.

Que é “etarismo”? De acordo com a Sociedade de Geriatria e Gerontologia, é o preconceito contra as pessoas idosas quanto a saúde, capacidade e empenho, idade, fragilidade. A senhora estudante que sofreu o preconceito por causa da idade nem idosa é. No Brasil, geralmente, as mulheres se aposentam depois dos 50 anos e, se for pelo regime do INSS, somente com 62 anos, conforme os anos de contribuição. Dificilmente se aposenta com 40 anos.

O etarismo é um tipo de preconceito que deixa muitas pessoas idosas, ainda lúcidas de suas faculdades mentais, indignadas e constrangidas. Logo, para combater o etarismo, precisamos informar as famílias, principalmente os jovens, sobre os direitos da pessoa idosa, inclusive o de ter acesso à educação. Assim, erradica-se o estereótipo de que quem tem certa idade não serve para mais nada, provocando a humilhação social por que muitos têm passado. E o que é humilhação social?

O Brasil, em 2021, tinha 215 milhões de habitantes. Destes, 31,23 milhões eram pessoas idosas, representando 14,7% da população, conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Em 2031, há uma previsão de 43 milhões. A maioria é de baixa renda e com baixa escolaridade. O País ainda tem 11 milhões de pessoas analfabetas (conforme dados de 2010, do IBGE), e, entre eles, a maioria é de idosos. Devemos incentivar a pessoa idosa a aproveitar melhor o tempo que tem, respeitando suas fragilidades, oferecendo-lhes conforto, conhecimento, dignidade. Por isso, é importante que todos os cidadãos continuem os estudos para, no futuro, diminuir essa situação. Aquela senhora que sofreu preconceito tinha menos de 60 anos. Ela estava buscando realizar seu sonho de ter uma profissão.

Segundo a antropóloga Guita G. Debert (Unicamp), a categoria “idoso” é uma “construção social”. Essa construção, discutida por diversos autores, retrata o papel da pessoa idosa na sociedade, antes e depois da Revolução Industrial, na cultura ocidental e nas sociedades milenares, o que varia de uma sociedade para outra. Os tipos de idosos são variados: urbanos, rurais, aposentados, profissionais, desempregados, os que moram pelas ruas, os que estão nos abrigos e nos hospitais, os que vivem com os parentes e os que vivem só. Todos têm a prerrogativa de ter acesso aos direitos fundamentais, como estudar.

Alguns filósofos podem auxiliar a refletir sobre a importância do envelhecimento. Por exemplo, Cícero (século I a.C.), filósofo romano, escreve sobre a velhice com otimismo e coragem, aconselhando a refutar quatro aspectos indesejados que costumam rondar o imaginário de anciãos e anciãs: 1) o impedimento das atividades; 2) debilitação do corpo; 3) afastamento dos prazeres; e 4) que está à beira da morte.

Outro filósofo, Sêneca (século I d.C.), chama a atenção para a brevidade da vida. Recomenda empregar o tempo da melhor maneira, na prática do bem e das virtudes, pois é a única coisa que levamos desta vida.

Com as mudanças culturais no século XX, a filósofa francesa Simone de Beauvoir, ao dedicar-se sobre o assunto, divide em dois momentos a questão: a visão de fora, da sociedade; e a visão de dentro, do próprio idoso. A vida pelos olhos dos próprios idosos, seja pobre ou rico, apresenta seus sentimentos como jovens. Por isso, respeitar os sonhos das pessoas de idade avançada é uma forma de ter respeito.

Em contraponto, há grupos da terceira idade que costumam programar reuniões ou viagens em excursão. Mas, ainda, há aquelas pessoas idosas que não têm condições de sair ou não querem sair, pois preferem ficar em seu cantinho. Ter empatia com todos é um ato de civilidade.

Ler o Estatuto da Pessoa Idosa (Lei 10.741/2003), pesquisar os direitos, ter cuidados com a saúde física, mental e espiritual é importante. Devemos combater o etarismo e a humilhação social contra os idosos. Se sofre violência, seja ela física, psicológica, financeira, patrimonial, afetiva, denuncie. Ligue para 180 ou vá direto a uma delegacia da mulher e da pessoa idosa. Sejamos solidários, solidárias com todos.

Que Cora Coralina, escritora aos 70 anos, inspire homens e mulheres a viver bem.

Maria Terezinha Corrêa
Mestra em Antropologia, especialista em Ensino de Filosofia, graduada em Filosofia e Pedagogia, cursou Teologia pelo Mater Ecclesiae, filiada à ABA, APEOESP e SBPC, membro da diretoria da APROFFIB, membro da Comissão de Prevenção e Combate à Tortura (ALESC) e voluntária na Pastoral da Pessoa Idosa, ligada à Arquidiocese de Florianópolis. Atualmente, professora de Filosofia na Prefeitura de São José-SC.

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