Os cangurus, quando nascem, vão diretamente para o marsúpio (bolsa na barriga da mãe). Eles nascem imaturos e precisam dessa proteção para se desenvolver. Ali, eles mamam e são protegidos. Ficam escondidos até mais ou menos dois meses, então começam a aparecer com a cabecinha para fora, saltitam buscando alimento na relva, próximo da mãe. Em torno de um ano, deixam definitivamente a bolsa materna, começando a ter vida independente e, aos poucos, tornam-se adultos, convivem com os outros cangurus, assumindo os papéis próprios dos cangurus adultos. São inofensivos. Somente atacam quando se sentem ameaçados.
Em alguns aspectos, nós, humanos, somos parecidos aos cangurus. Também nós, quando nascemos, precisamos dos cuidados maternos, leite, proteção, afeto. Normalmente, a criança se alimenta com o leite da mãe durante seis meses e aí começa a receber alimento mais sólido até não necessitar mais do peito materno. Deixa de mamar, mas continua precisando de proteção e afeto até ficar adulta. Conforme cresce, vai adquirindo mais autonomia. Passada a adolescência, assume papéis e responsabilidades, e convive nos grupos sociais, interagindo como uma pessoa adulta. Esse deveria ser o processo normal e é o esperado pelos demais.
No dia a dia, contudo, há muitas pessoas adultas em idade, mas que se comportam e continuam como cangurus bebês. Não conseguem viver independentes do “colo” materno. Buscam pessoas que lhe façam às vezes de mãe, babá permanente. Suas relações são marcadas por apegos exigentes e permanecem infantis em sua busca de proteção e afeto. Não amadurecem afetivamente. São homens, mulheres, em idade cronológica de adultos, exercendo papéis de adultos, são responsáveis, têm competência profissional e, no entanto, na parte emotivo-afetiva, comportam-se como crianças. Não amadureceram e reagem às desatenções com atitudes que destoam do comportamento esperado. Continuam na dependência dos cuidados “maternos” como cangurus que não conseguem abandonar o marsúpio.
Essas situações aparecem em diferentes formas de conduta. Há pessoas que abrem mão de sua autonomia, renunciam a uma personalidade própria, contanto que alguém se encarregue de cuidar delas, são dependentes. Há outras que, de modo mais disfarçado, procuram dominar outras pessoas para tê-las a seu serviço, comprando o afeto com favores e outras formas de recompensa. Há também aquelas que tentam nutrir sua afetividade imatura com chantagens emocionais ou mesmo com doenças. Existem ainda as pessoas que se fecham num mundo à parte, como solitárias, desligadas da vida dos demais. Outras tantas reagem às frustrações afetivas com vitimismo escandaloso, chamando atenção pelo exagero de suas “dores”. Muitas outras formas poderiam ser elencadas. Esses exemplos ilustram o quanto a questão afetiva é importante no processo de crescimento e amadurecimento.
Nas questões afetivas, a maturidade não se mede pelo número de anos que a pessoa tem. Uma pessoa de 50 anos pode ser mais imatura do que uma de 25. Em geral, a causa do problema se encontra nas interações mal dosadas do início da vida. É nesse período que os desequilíbrios começam e a responsabilidade maior recai sobre os “cuidadores”, isto é, as pessoas mais significativas na vida da criança (mãe, pai…).
O aspecto afetivo é determinante para o equilíbrio de relações sadias. Criança mal-amada, em geral, será adulto problemático. Cuidar bem delas enquanto não sabem se autogerir é garantir-lhes a possibilidade de serem adultos independentes, capazes de convívio sadio com os demais. Os filhotes de cangurus, quando adultos, não precisam mais do marsúpio, porque, aos poucos, aprenderam a cuidar de si como independentes, mantendo-se em comunhão com seu grupo. Conforme crescem, seus “pais” deixam que vivam suas vidas, integrando-se como adultos na sociedade dos cangurus. Quem sabe nós, humanos, poderíamos aprender algo com os cangurus? Para nos tornar pessoas maduras não apenas no tamanho físico e na competência profissional, mas também nas relações sociais equilibradas e sem muitos subterfúgios que atrapalhem a autonomia sadia, as quais permitam um convívio mais harmonioso com os demais.
A maior parte das relações conflituosas se deve à imaturidade afetiva. Há adultos que se comportam como crianças manhosas as quais se emburram diante da menor frustração e se abraçam em seu vitimismo, pelo qual lamentam seu “abandono” e sofrem pela falta que sentem de afeto e reconhecimento. Filhote de canguru cresce e se torna independente, homem e mulher adultos deveriam ser assim também, mas muitos não o são porque ainda dependem do “marsúpio” de alguém que lhes faça as vezes de mãe/pai, pois ainda não sabem se virar sozinhos. Seu eu infantil continua reclamando cuidados maternos porque, defasados em seus afetos, sentem-se desamparados quando alguma contrariedade os afeta. Adultos carentes são problemas permanentes nas relações com os outros. Canguru adulto vive sua condição como tal, homem e mulher adultos nem sempre.
Pe. Deolino Pedro Baldissera, SDS
Padre salvatoriano há 43 anos, professor e psicólogo pela Universidade Gregoriana de Roma, com mestrado em Psicologia e doutorado em Ciências da Religião. Atualmente é pároco em Videira-SC.S