As soluções tecnológicas entram de maneira inusitada nos festejos de São João e São Pedro neste ano. Nos centros urbanos do Sudeste do Brasil, as danças juninas estão sendo adaptadas à realidade do isolamento social, forçado pela pandemia do covid-19. Restringiu-se a participação ao máximo de quatro a cinco pessoas (e somente dentro da convivência familiar), em ambientes que em nada lembram os velhos arraiais: apartamentos e salões de festas de condomínios.
Algumas escolas em São Paulo-SP orientam professores e estudantes a ensaiarem em casa a quadrilha, com a separação dos participantes em duplas. Quando ocorrerem as apresentações, acessíveis pelas redes sociais, cada família filmará sua performance, e as imagens vão compor o mosaico de dezenas de duplas dançando alegremente.
Um dos colégios que adotam um protocolo específico para as brincadeiras juninas é o Objetivo Saint Lucas, na Zona Leste de São Paulo. Inicialmente, a direção da escola pensou em realizar lives com as apresentações de alunos e professores, mas essa mudança na tradição do arraial ainda traz insegurança. “E se a internet estiver instável e, no meio da quadrilha, sair do ar a apresentação?”, pergunta a diretora Leila Cury.
Diante do risco, o colégio deve editar um vídeo com as danças e até mesmo as receitas da culinária junina, sob coordenação da professora de Artes. A produção será publicada nas redes sociais.
A intenção dos realizadores é evitar o adiamento dos festejos, opção escolhida pela Prefeitura de Campina Grande-PB, onde as comemorações serão em outubro. Em Salvador-BA e Aracaju-SE, o feriado de São João foi antecipado para maio, justamente para esvaziar (!) a festa e impedir aglomerações.
No seu celular, os antigos arraiais
Mesmo que as tecnologias “façam sua parte” e diminuam o impacto do isolamento social, a vivência da cultura popular e da religiosidade estará sob a influência do uso que se faz dos “facebooks” e dos “whatsapps”.
A função mais humana que se pode esperar de ambos é que reconectem pessoas e suas comunidades. Já pensou se as redes sociais forem usadas, neste mês de junho, para aproximar você de quem fez a alegria dos antigos “arraiais” em sua escola ou paróquia?
Lembre-se de que, com um simples celular, é possível falar com aqueles, aquelas que já prepararam iguarias deliciosas (quentão, bolo de milho, paçoca) ou que se destacaram por conseguir prendas inestimáveis, ou que, ainda melhor, organizaram, muitas vezes, a novena de São João ou a de São Pedro e trabalharam nas barraquinhas até tarde.
Em 2020, os prédios não estarão embandeirados, as ruas perderão as cores dos vestidos estampados das moças caipiras, as quermesses que enchiam as paróquias de calor humano estarão canceladas… Mas aqueles voluntários e voluntárias continuam por perto. Talvez estejam dentro de nossas casas. E o contato com eles, com elas pode acender a fogueira da gratidão e da caridade, e não deixar morrer São João e São Pedro neste junho de noites frias e de pandemia que nos assusta.
José Manoel Rodrigues é jornalista e educomunicador. Há três anos, atua na área de captação de recursos. É cofundador da Radar Consultoria de Projetos para Organizações Sociais.