Nesta quinta-feira, 13 de agosto, às 19h, o maestro João Carlos Martins participa ao vivo de um bate-papo sobre a arte de agir com amor e emoção para superar os desafios. O artista é o convidado do webinar Tecendo Relações. A conversa será mediada pela professora Edja Camila, do Colégio Imaculado Coração de Maria, no Rio de Janeiro-RJ. A transmissão será pelo canal da Rede de Educação Missionárias Servas do Espírito Santo, no Youtube.
O professor Marcus Vinícius Leles de Barcelos, que leciona Literatura e História da Arte no Colégio Sagrado Coração de Jesus, em Belo Horizonte-MG, conta um pouco mais sobre o maestro João Carlos:
“Aos 5 anos, João precisou submeter-se a uma cirurgia para a remoção de um tumor benigno incrustrado em seu pescoço. Todavia o procedimento contou com alguns revezes. Sensibilizado, o pai do menino decidiu presenteá-lo com um instrumento, o piano.
O pai de João lhe sentenciou ao apresentar o instrumento pelo qual o garoto desenvolveria verdadeira fascinação: ‘Nós vamos perseguir o sonho de você se curar, e você ficará curado’. Iniciou-se, assim, a relação entre o menino e a música. João, sanado em nova cirurgia aos 8 anos, debruçou-se cada vez mais sobre as teclas.
Aos 13 anos, João Carlos Martins estabelecera-se como concertista com sólida carreira pelo Brasil. Aos 18, passou a constelar entre os nomes de lustre do cenário internacional. Pouco depois, consagrou-se em apresentações no Carnage Hall, em Nova Iorque, sempre com lotação esgotada. Em tais ocasiões, peças de Bach eram as melhores vitrines para o virtuosismo do brasileiro. João não apenas os versava com facilidade como adestrou seu corpo a um novo patamar de exigência. Tornou-se capaz de executar vinte e uma notas por segundo.
Em 1965, o músico residia em Nova Iorque, quando o time da Portuguesa de Desportos visitou a cidade por ocasião de um jogo-treino, para o qual convidou João Carlos Martins a integrar a equipe oficial. Contudo, em um desfecho inusitado, a participação do pianista na partida foi interrompida por um acidente que provocou a perfuração de seu braço à altura do cotovelo e comprometeu o pleno funcionamento do nervo ulnar, relacionado à elaboração motora das falanges. Como consequência, João Carlos Martins precisou afastar-se temporariamente do piano, devido à atrofia de três dedos.
A situação se agravou alguns anos depois, quando o músico, que em nenhum momento desistiu da vocação e manteve-se engajado em exaustivos tratamentos, desenvolveu um quadro de lesão por esforço repetitivo. Entretanto, em um exemplo incrível de superação, o pianista conseguiu voltar aos palcos após longas e atribuladas sessões de fisioterapia. Não se desapegou, aliás, da paixão por Bach. Entre 1979 e 1985, realizou várias e significativas gravações das composições do mestre barroco.
Em 1995, uma nova pirueta do destino. Ao sair de um teatro na cidade de Sófia, na Bulgária, João Carlos Martins foi golpeado na cabeça com uma barra de ferro, em um assalto. A concussão causou uma sequela neurológica que impôs restrições ainda mais severas à mobilidade do braço direito. Passou a executar peças que demandassem apenas a utilização de sua mão sã, como o álbum Só para a mão esquerda, composto por Maurice Ravel para Paul Wittgenstein, pianista austríaco que perdeu o braço direito durante a Primeira Guerra Mundial. No entanto, acabou por ter a mão esquerda inviabilizada pelo acometimento de uma nova moléstia, a contratura de Dupuytren. Desse ponto em diante, iniciou um longo périplo pela regência antes que pudesse voltar ao piano.
A transição à posição de maestro acarretou novas necessidades de adaptação. Impossibilitado de manusear as partituras em tempo hábil para reger a orquestra, João Carlos Martins passou a memorizar, nota por nota, as peças que se propunha apresentar. Ressignificou também sua fascinação por Bach por meio da criação da Bachiana Filarmônica e da Bachiana Jovem, instituições responsáveis pelo recrutamento e pela revelação de grandes talentos musicais. Surpreendentemente, em 2020, deu-se o reencontro do músico com o piano, por meio de um par de luvas biônicas projetadas pelo designer industrial Ubiratã Bizarro Costa, as quais restituíram a mobilidade às mãos de João.
A trajetória de João Carlos Martins é uma peça executada a vários andamentos. Nunca em silêncio. E para aqueles que, a qualquer momento, pensaram-no fora de cena, não se iludam. Como todo bom prestidigitador de Bach, João Carlos Martins é mestre da invenção e do improviso. Tem a arte sutil do ardil e da saída. Tocata e Fuga. Conhecê-lo é um privilégio que será experimentado pelos colaboradores da Rede de educação das Missionárias Servas do Espírito Santo no webinar Tecendo Relações.”
Marcus Vinícius Leles de Barcelos é graduado em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais e mestre em Teoria da Literatura e Literatura Comparada pela mesma instituição. É professor de Literatura e de História da Arte do Colégio Sagrado Coração de Jesus.