Aproximando-se a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, que, em 2021, celebramos no dia 11 de junho, não podemos deixar de nos lembrar de nosso santo fundador, Arnaldo Janssen, que foi profundamente influenciado por sua devoção e a levou consigo para animar espiritualmente suas fundações missionárias.
A devoção ao Sagrado Coração de Jesus é muito antiga e sempre foi ligada à contemplação da Paixão de Jesus Cristo. Ignorada totalmente no primeiro milênio, ela aparece, pela primeira vez, com traços claros, com a escola cisterciense e, mais tarde, na ordem franciscana. A partir do século XVII, por meio das visões de Santa Margarida Maria Alacoque, essa devoção foi popularizada, sendo um dos focos da Escola Francesa de Espiritualidade, que marcou profundamente a Igreja na Europa Ocidental.
A espiritualidade do Sagrado Coração é muito simples, acessível a todas as pessoas. Ela tem como objetivo ajudar o fiel a voltar-se para seu coração e para o Coração de Jesus, como núcleo mais íntimo da pessoa, onde ela se encontra com seu Senhor. Essa devoção difunde que “O coração de nosso coração é o próprio Deus, com a sua lógica enraizada no amor”. Ela nos aproxima do amor compassivo de Cristo para com a humanidade. Nela, pedimos que sejamos revestidos das virtudes e das qualidades do Coração do Filho, deixando-nos inflamar pelo amor que o impulsionava, tornando-nos sempre mais semelhante a ele e formando com ele um só corpo. Ela contempla ainda o coração transpassado de Jesus que, na Cruz, entregou-se por nós com um imenso amor gratuito e compassivo.
Em 1856, duzentos anos após as aparições de Jesus a Santa Margarida Maria, foi instituída a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, a ser celebrada, a cada ano, no mês de junho. O movimento que mais propagou sua devoção no século XIX foi o Apostolado da Oração, aprovado pelo Papa Pio IX, em 1849. Hoje o Apostolado é obra pontifícia. A consagração do mundo ao Sagrado Coração ocorreu em 16 de junho de 1875, às vésperas da fundação da Congregação do Verbo Divino. Mais de 400 institutos de vida religiosa com espiritualidade cordiana foram fundados de 1800 até o Concílio Vaticano II, em sua maioria, femininos.
Como filho de seu tempo, Arnaldo Janssen foi também impregnado por essa espiritualidade afetiva e concreta que respondia às necessidades do simples cristão. Inicialmente, recebeu na família forte influência da mística da Baixa Renânia, de espiritualidade cristocêntrica e trinitária. Seu pai falava com paixão para os filhos sobre a encarnação do Verbo e rezava diariamente com eles o Prólogo de São João. Sua mãe, uma pessoa silenciosa, testemunhava uma vida de oração contínua, alimentada pela frequência diária à missa. Foi também com o pai que o menino Arnaldo conheceu o Anuário da Propagação da Fé, que o introduziu ao amor às missões estrangeiras.
Como jovem padre, a devoção especial ao Sagrado Coração foi ocupando suas orações e reflexões. Inicialmente, resolveu rezar, às sextas-feiras, a missa em honra do Sagrado Coração, para glorificar seu sacerdócio. Queria homenagear a Trindade habitando nesse Coração. Para Arnaldo, o Coração de Jesus era a humano-divina Pessoa de Jesus, a face humana de Deus, seu amor incompreensível pela humanidade.
A partir de 1866, ao lado das aulas que administrava, passou a dedicar uma atenção especial ao novo Apostolado da Oração em sua diocese. Esse apostolado, com forte espiritualidade cordiana, deixou suas marcas na vida de oração de Arnaldo. Sua profunda motivação passou a ser sua união fundante com as disposições do Sagrado Coração, emergindo daí o traço característico de sua espiritualidade, inicialmente assim expresso: “Viva o Coração de Jesus nos corações de todas as pessoas!”.
Arnaldo foi se tornando mais e mais habitação do Sagrado Coração, e os propósitos e intenções desse Coração, assumidos como seus. Desejava ardentemente a glorificação do Deus Trino e o cumprimento de sua vontade salvífica para todos os povos. O amor e a bondade de Jesus, sua compaixão sincera, suas virtudes humanas, seu sofrimento e aflições, sua atitude de entrega incondicional, suas emoções e sentimentos íntimos, tudo tinha para Arnaldo seu lugar e centro no Sagrado Coração de Jesus. Escrevia assim no livro de admissão dos novos membros ao Apostolado de Oração: “A melhor devoção ao Coração de Jesus é conformar nossos desejos aos desejos do Coração de Jesus”.
Por meio do Apostolado da Oração, Arnaldo foi também tomando consciência de uma variedade de situações eclesiais, abrindo, assim, a mente aos grandes propósitos da Igreja. Seu dinamismo missionário, na força da oração, foi se revelando com o Apostolado. Iniciou, em 1866, com 26 grupos na diocese de Münster. Após sete anos, sua missão no Apostolado tinha se espalhado por várias dioceses alemãs, alcançando um total de 600 paróquias. Dois anos depois, em 1875, em meio a muitas lutas e rejeições, Arnaldo estava pronto para iniciar a primeira casa de formação missionária na Igreja alemã.
Dentro de sua espiritualidade, Arnaldo foi enxergando cada vez mais o Coração de Jesus como Tabernáculo da Trindade: “A Trindade toda reside no Coração de Jesus: a Onipotência do Pai, a Sabedoria e a Beleza do Verbo Eterno e o Generoso e Eterno Amor do Espírito Santo. Contudo o Coração de Jesus permanece um coração criado, um coração humano”.
Com o tempo, Arnaldo vai explicitando assim a relação entre o Coração de Jesus e o Espírito Santo: “Durante sua vida terrena, o Coração de Jesus já era a fornalha ardente cheia do amor e da graça do Espírito Santo”. Arnaldo viu um duplo movimento entre o Coração de Jesus e o Espírito Santo: de um lado, foi o Espírito Santo que formou o Coração de Jesus e fez dele sua morada; por outro, é do Coração de Jesus que emergem todas as graças que recebemos do Espírito Santo, pois é pela encarnação de seu Filho que Deus comunica-se a si mesmo em seu insondável amor incondicional.
No fim de sua vida, Arnaldo escreve: “Vou tentar chegar tão perto quanto possível dos sentimentos de Jesus, de sua vida interior, de seus ensinamentos, realizações, dores e morte. Na Eucaristia, vou oferecer, juntamente com Cristo, ao Pai e ao Espírito Santo todos os meus sofrimentos e dificuldades, tudo o que Deus me manda”.
Arnaldo nos deixou um legado: encontrar-se com a Trindade no Coração de Jesus para deixar-nos transformar por ela. “Se alguém me ama, guardará minha Palavra e o meu Pai o amará e a ele viremos e nele estabeleceremos morada” (João 14,23). E essa morada é uma morada aberta, que pela graça do Espírito Santo que nos torna Igreja em saída.
Rezemos com Santo Arnaldo: “Viva o Coração de Jesus nos corações de todas as pessoas!”.
Irmã Maria Inês de Aragão, SSpS, é formada em Economia , Diretora Tesoureira da Redes (Rede de Solidariedade das Missionárias Servas do Espírito Santo) e Coordenadora da comunidade Madre Maria em Belo Horizonte.