“Despertadas pelo grito da Trindade, através da dor e do sofrimento da Mãe Terra e de nossos irmãos e irmãs à margem, a conversão ecológica e a vida sustentável se tornam um compromisso ético inalienável.” Essa é a segunda direção do XV Capítulo-Geral, realizado em janeiro de 2021, para os anos de 2022 a 2028.
“Compromisso ético inalienável com a Mãe Terra e a conversão ecológica”, uma luz para nosso caminhar sem as atitudes da indiferença e de uma ressignificação acomodada ou a confiança cega nas soluções técnicas que dificultam os caminhos de solução e que vão da negação do problema.
A afirmação do Papa Francisco, por meio da Encíclica Laudato si’, surge no ano de 2015, apontando que “As mudanças climáticas são um problema global, com graves implicações ambientais, sociais, econômicas, distributivas e políticas, constituindo atualmente um dos principais desafios para a humanidade”.
A Ciência fielmente divulga os dados e estatísticas muito claras e drásticas a respeito dos sinais dos tempos, a ponto de que a vida no planeta está em perigo. E, em vista disso, precisamos criar uma sensibilidade maior em defesa dos sinais vitais da Terra. Com as mudanças que estão acontecendo, o compromisso com a proteção e o cuidado faz diminuir os efeitos da crise climática vinda com tanta força, e devem ser enfrentadas com coragem. É necessário alargar a compreensão da crise e não a naturalizar, pois não será o “clima de negacionismo” que salvará o planeta.
Avistei, esses dias, algo que me chamou muito atenção: uma adolescente segurando um cartaz com a frase “Cadê o rio que passava aqui?”. Percebemos, sempre com maior intensidade, que igarapés e rios estão desaparecendo, a seca histórica, com graves consequências, está impactando milhões de pessoas. No ano de 2023, enfrentamos temperaturas sem precedentes em muitos locais. Chuvas e enchentes destruindo e levando as moradias, as funções naturais do planeta estão se alterando por causa das mudanças climáticas, como escutei numa live com Dom José Ionilton, recém-nomeado para a Prelazia do Marajó (Pará), dizer: “Desastre que, de natural, não tem nada […], de inesperado, menos ainda! Um evento extremo causado pela crise climática”. Consequências, consequências e, mais uma vez, consequências graves!
Assim, lembrando as palavras do Papa Francisco:
Já se passaram oito anos desde a publicação da carta encíclica Laudato si’ quando quis partilhar com todos vós, irmãs e irmãos do nosso maltratado planeta, a minha profunda preocupação pelo cuidado da nossa Casa Comum. Mas, com o passar do tempo, dou-me conta de que não estamos a reagir de modo satisfatório, pois este mundo que nos acolhe está se desmoronando e talvez se aproximando de um ponto de ruptura. Independentemente dessa possibilidade, não há dúvida de que o impacto da mudança climática prejudicará cada vez mais a vida de muitas pessoas e famílias. Sentiremos seus efeitos em termos de saúde, emprego, acesso aos recursos, habitação, migrações forçadas e em outros âmbitos (Laudate Deum, 2).
Pelo compromisso ético inalienável, confirmamos nossa responsabilidade por esta Casa que é uma Casa viva, neste Planeta que é um Planeta vivo e vivente com seu grito pela vida.
Na Laudate Deum (n. 5), podemos ler:
Por mais que se tente negar, esconder, disseminar ou relativizar a crise climática global, os sinais da mudança climática impõem-se de forma cada vez mais evidente. Ninguém pode ignorar que, nos últimos anos, temos assistido a fenômenos extremos, a períodos frequentes de calor anormal, seca e outros gritos da terra que são apenas algumas expressões palpáveis de uma doença silenciosa que nos afeta a todos. É verdade que nem todas as catástrofes se podem atribuir à alteração climática global. Mas é possível verificar que certas mudanças climáticas, provocadas pelo homem, aumentam significativamente a probabilidade de fenômenos extremos mais frequentes e mais intensos.
O Papa Francisco afirma mais ainda:
Vejo-me obrigado a fazer essas especificações, que podem parecer óbvias, por causa de certas opiniões ridículas e pouco racionais que encontro mesmo dentro da Igreja Católica. As atitudes que dificultam os caminhos de solução, mesmo entre os crentes, vão de negação do problema a indiferença, a ressignificação acomodada ou a confiança cega nas soluções técnicas (Laudate Deum, 14).
Uma chamada de atenção, um grito de alerta ou chamado de um despertar profundo e muito evidente para toda humanidade e para cada ser humano. Nem todo progresso é bom, por isso somos convocadas a repensar nossa utilização do poder, aquele que destrói a natureza, a Casa Comum. Convocadas pelo Papa Francisco na Laudate Deum (n.º 27):
Por conseguinte, um ambiente saudável é também o produto da interação humana com o meio ambiente, como ocorre nas culturas indígenas e ocorreu, durante séculos, em várias regiões da Terra. Muitas vezes, os grupos humanos “criaram” o meio ambiente, remodelando-o de algum modo sem o destruir nem o pôr em perigo. O grande problema atual é que o paradigma tecnocrático destruiu essa relação saudável e harmoniosa. Contudo a indispensável superação desse paradigma tão nocivo e destruidor não se encontra numa negação do ser humano, mas passa pela interação dos sistemas naturais “com os sistemas sociais”.
O caminho apontado pela Laudate Deum é
Responder aos novos desafios e reagir com mecanismos globais aos desafios ambientais, sanitários, culturais e sociais, sobretudo para consolidar o respeito dos direitos humanos mais elementares, dos direitos sociais e do cuidado da Casa Comum. Trata-se de estabelecer regras universais e eficazes para garantir essa proteção mundial.
Precisamos entrar numa onda de “contra paradigma” em busca das luzes, acreditar que existe outro modelo. Outra possibilidade de vida neste planeta é a mudança do comportamento diante da natureza, pois, no mundo todo, em todos os biomas e ecossistemas, os sinais dessas mudanças estão cada vez mais evidentes. Nós precisamos mudar e construir o “nós” que habita a Casa Comum, lugar que nos faz habitáveis. Precisamos de um plano de ação para a despoluição do ar, das águas e da Terra, assumido por todas nós. O desafio é acreditar e criar alternativas como combater a riqueza concentrada nas mãos de poucas elites e o excesso de luxo; colocar-se contra o modelo colonizador do agronegócio, destruindo e poluindo a terra e as águas; e investir nas alternativas de vida comunitária e partilha de tudo, pois Deus criou o mundo para todos os seres vivos! “Todo ser que respira, louve o Senhor!” (Salmo 150).
Irmã Aurélia Príhodová
Missionária Serva do Espírito Santo, graduada em Serviço Social e pós-graduada em “Violência doméstica: perspectivas em práticas interdisciplinares” na Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI-RS), missionária na Diocese de Roraima.