Este texto pretende ser uma simples reflexão sobre o tema central que guiará este ano de 2024. Como todas sabemos, procuramos atualizar cada uma das Diretrizes do 15º Capítulo-Geral, concentrando nosso ser e fazer missionários em uma palavra-chave que nos ajudará a traduzir em gestos nossa oração e reflexão.
Vamos refletir, nesta série de três textos, a segunda diretriz de nosso Capítulo-Geral: “Despertados pelo grito da Trindade através da dor e do sofrimento da Mãe Terra e de nossos irmãos e irmãs à margem, descobrimos que a conversão ecológica e uma vida sustentável se tornam um compromisso ético inalienável”.
Essa diretriz nos ajuda a refletir que encontramos e escutamos o Deus trinitário em tudo o que Ele criou. Existe alguma coisa que possa ser indiferente a Deus? Como Paulo afirma, “De fato, os atributos invisíveis de Deus, seu poder eterno e sua divindade são compreendidos através das coisas feitas, desde a criação do mundo” (Romanos 1,20).
Esta série, portanto, é uma contribuição para a compreensão da compaixão a partir do ponto de vista antropológico, espiritual e missionário. Esperamos que possa ajudar você em suas reuniões comunitárias, bem como com os leigos e leigas que estão na missão.
Quando falamos compaixão: o que pensamos?
Em primeiro lugar, é necessário ter consciência de que a palavra “compaixão” tem origem na esfera humana e social, e não apenas no ambiente religioso e bíblico. Assim, sua prática pode gerar pontes entre sociedades e famílias, e valores evangélicos e, ou, cristãos.
No contexto da sociedade e da vida familiar, costumamos falar de “atos de solidariedade”, quando o que é organizado tem como objetivo ajudar os outros. Tudo depende da situação que suscite a solidariedade das pessoas, vizinhos, colegas de trabalho ou estudantes. Seja qual for o motivo e a forma como se expressa, está sempre relacionado com a ajuda a quem precisa.
Nesse sentido, podemos nos perguntar: que gestos, ações ou tipos de cooperação estão presentes em nosso meio social? Poderíamos nos dar a tarefa de observar, durante uma semana, quinze dias ou um mês, como as pessoas, famílias, amigos, colegas de trabalho, etc., expressam a sua solidariedade. Assim, podemos ver se há mais solidariedade do que indiferença em nossa sociedade.
A compaixão no contexto bíblico/espiritual
No contexto da teologia bíblica, a partir do Antigo Testamento (AT), aparece a palavra hesed, traduzida como “compaixão” e, ou, “misericórdia”. Esse termo contém dois traços característicos: um prático e um comunitário.
Em relação à primeira característica, é algo concreto, o qual a pessoa ou as pessoas experimentam real e efetivamente.
Quanto ao comunitário, refere-se ao que é demonstrado entre várias pessoas, àquilo que é pedido e esperado de outra pessoa. Em ambos os contextos, a característica comum é a ação em favor daqueles que são tocados pela tragédia ou pela necessidade, e é uma ação que busca o bem e não o mal das pessoas necessitadas. Essa ação é permanente e se traduz em uma atitude de vida.
Que necessidades ou tragédias vivem as pessoas à nossa volta?
Ao observarmos o AT, podemos ver Deus como o Senhor da Aliança, que, no Monte Sião, apresenta-se como o Deus misericordioso e clemente, lento para a ira e rico em amor e fidelidade, que mantém seu amor por mil gerações, perdoa a injustiça, a rebeldia e o pecado, mas não os deixa impunes (cf. Êxodo 34,6-7). Isso indica que as infidelidades do povo escolhido não são uma quebra da Aliança, mas um “aguilhão” para o amor de Deus, que deve buscar novas maneiras de suscitar no povo a resposta de amor e fé esperados.
No Novo Testamento (NT), especialmente nos Evangelhos, encontramos uma palavra-chave: éleos. Esse termo é usado no NT, no contexto do clamor daqueles que vêm a Jesus implorando algum tipo de favor: “Filho de Davi, tende piedade de mim!”. Sabemos que aqueles que vêm a Jesus são os sofredores, os desamparados, os doentes, os possuídos por espíritos malignos; em outras palavras, aqueles que clamam por misericórdia para si e para seus entes queridos. São as pessoas que estão esperando por uma resposta compassiva de Jesus.
Em relação com o AT, no NT, encontramos alguns textos bíblicos que apresentam uma forte mensagem ética, como nas Bem-aventuranças (Mateus 5,1-12) e nas parábolas do Bom Samaritano (Lucas 10,25-37) e do Servo Perdoado (Mateus 18,21-35). Em cada uma dessas histórias e em outras, o convite é para reconhecer a misericórdia de Deus como um dom que traz consigo a resposta implícita de solidariedade concreta por parte dos irmãos e seguidores de Jesus. O chamado é para viver o seguimento no amor compassivo de Jesus e não o simples cumprimento de ritos e práticas religiosas externas, como faziam os fariseus (cf. Mateus 23,13-28).
Irmã Kreti Soledad Sanhueza
Missionária serva do Espírito Santo.