Solenidade da Santíssima Trindade

“Deus amou tanto o mundo que deu o seu Filho unigênito, para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna.” (Jo 3,16-18)

Hoje celebramos o mistério insondável de Deus, a Santíssima Trindade. Durante os primeiros séculos de sua existência, a Igreja lutou com dificuldades para expressar em palavras o inexprimível: a natureza do Deus em que acreditamos. Chegou à expressão profunda do Credo Niceno-Constantinopolitano o qual celebra o Pai “Criador de todas as coisas”, o Filho “Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial com o Pai”, e o Espírito que “dá a vida, e procede do Pai e do Filho”. Mas mesmo essas expressões tão profundas não conseguem explicar a Trindade, pois, se Deus fosse compreensível à mente humana, não seria Deus!

Dentro das limitações da linguagem humana, tentamos expressar o mistério da Trindade como “três pessoas em uma única natureza”. Mas, mais importante do que encontrar fórmulas filosóficas ou teológicas abstratas para expressar o que, no fundo, não é possível definir, é descobrir o que a doutrina da Trindade pode nos ensinar para a nossa vida cristã.

Talvez o livro de Gênesis possa nos ajudar. Lá se diz que Deus “criou o homem à sua imagem; à imagem de Deus ele o criou; e os criou homem e mulher” (Gn 1,28). Se somos criados à imagem e semelhança de Deus, é de um Deus que é Trindade, que é comunidade, unidade perfeita na diversidade.

Assim, só podemos ser pessoas realizadas quando vivemos comunitariamente. Quem vive só para si está destinado à frustração e infelicidade, pois está negando a sua própria natureza. O egoísmo é a negação de quem somos, pois nos fecha sobre nós mesmos, enquanto fomos criados à imagem de um Deus que é o contrário do individualismo, pois é trinitário.

No mundo pós-moderno, onde o individualismo social, econômico e religioso é tido como critério fundamental da vida, a doutrina da Trindade nos desafia para que vivamos nossa vocação comunitária, criando uma sociedade de partilha, solidariedade e justiça, no respeito do diferente do outro, pois fomos criados à imagem e semelhança desse Deus que é amor e comunhão.

O texto evangélico nos faz lembrar que somos continuadores da missão da Trindade encarnada em Jesus de Nazaré: a de testemunhar o Reino de Deus, vivendo em comunidade o projeto de Jesus, o missionário do Pai, que nos congregou na Igreja pela ação do Espírito Santo. Quando criarmos comunidades alternativas de solidariedade, fraternidade, justiça e paz, estaremos vivendo na imagem e semelhança do Deus Uno e Trino, comunidade e comunhão perfeita, que nos convida a participar da sua própria vida.

A festa de hoje não é de um mistério matemático (como se fosse possível explicar “três em um”), mas do mistério do amor de Deus, que nos criou para que vivêssemos comunitariamente à sua imagem e semelhança. É, portanto, ao mesmo tempo, celebração e desafio, para que tornemos cada vez mais concreto o projeto de Deus para toda a humanidade, no caminho do discipulado de Jesus.

Padre Tomaz Hughes, SVD, biblista e assessor da CRB e do Cebi. Dedicou-se a cursos e retiros bíblicos em todo o Brasil. Publicou diversos artigos e o livro “Paulo de Tarso: discípulo-missionário de Jesus”. Faleceu em 15 de maio de 2017. Suas reflexões bíblicas são muito atuais.

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