Terapia Ocupacional: os desafios de tornar os humanos mais humanos

Com o advento da pandemia de covid-19, a partir de março de 2020, a humanidade passou o foco de sua atenção à vida e à saúde, como talvez há muito tempo não acontecia. O isolamento imposto principalmente a idosos e crianças fez com que essas populações sofressem, em maior escala, os efeitos da solidão, do ócio compulsório e da falta de socialização. Com a tensão cada vez maior em torno da doença, muitos foram aqueles que desenvolveram outros problemas de saúde, entre eles transtornos psicológicos, neurológicos, psiquiátricos, além dos físicos. Mesmo entre os pacientes recuperados de covid-19, houve casos de sequelas motoras, psicológicas, sociais. 

Os profissionais de saúde e educação, principalmente, foram os mais requisitados para dar conta dessas mazelas. Entre eles, os terapeutas ocupacionais são talvez aqueles que, ao lado de psicólogos e psiquiatras, tomaram e continuarão a tomar a frente da recuperação, a longo prazo, dos pacientes pós-covid-19. 

A Terapia Ocupacional (TO), estabelecida como profissão no Brasil apenas em 1969, ainda carece de entendimento por parte da população leiga sobre suas funções e áreas de atuação. Apesar de ter surgido como ciência e prática durante a I Guerra Mundial, na segunda década do século XX, para ajudar soldados feridos em combate, a TO se configura como vasto campo de intervenções práticas sobre pacientes com algum grau de deficiência inata ou adquirida. 

O terapeuta ocupacional atua em variados cenários, desde hospitais, casas de repouso, instituições asilares, até creches, escolas, locais de reabilitação. O público que atende vai desde crianças com deficiências inatas até adultos e idosos com sequelas de acidentes, AVC ou quaisquer outros eventos que os tenham privado de suas autonomias. Aliás, a autonomia do paciente é o foco do tratamento. É por meio das técnicas e da dedicação dos profissionais de TO que os pacientes conseguem realizar suas “atividades da vida diária” (AVD), como usar o banheiro, fazer higiene pessoal, andar sozinho, falar e manifestar seus desejos, alimentar-se sem auxílio, etc. 

Apesar de o objetivo da TO ser essencialmente o de tornar mais autônoma a vida de pacientes com algum tipo de dificuldade, é notório que muitas outras classes de dificuldades estão por vir com o fim da pandemia. Nos próximos anos, é importante ressaltar a relevância da TO não somente para os pacientes recuperados de covid-19 como também para todas as pessoas que necessitam reaprender a conviver socialmente, a trabalhar em grupo, a desenvolver atividades em meio a outras pessoas. 

O isolamento fez com que os humanos deixassem de lado habilidades que os caracterizam como espécie. Isto é, a manifestação do afeto (quanta falta faz um abraço!), a leitura da linguagem não verbal (como reconhecer as palavras não pronunciadas por trás de máscaras que escondem os rostos), a proximidade entre humanos (o distanciamento dificultou o sentido de presença humana); tudo isso precisa ser reaprendido. 

De forma carinhosa, porém firme e prática, o profissional de TO é aquele que, por meio de jogos, artes manuais, exercícios ou simplesmente da atenção dispensada a quem precisa, ajuda o paciente e se reencontrar com suas habilidades. Conseguir levar um talher à boca sem auxílio, ser capaz de usar o banheiro adequadamente, dar um passo de cada vez, mesmo com o andador, todas essas vitórias fazem parte do cotidiano desses profissionais que trabalham, acima de tudo, com amor. O amor ao ser humano é item indispensável nas intervenções que primam pelo cuidado, e o terapeuta ocupacional é, sem dúvida, aquele cuja prática é permeada por esse sentimento. 

Maurício Wisniewski

Coordenador e professor do Curso de Psicologia no Colégio e Faculdade Sant’Ana, em Ponta Grossa-PR.

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