A vocação à vida religiosa consagrada decorre da experiência vivenciada por pessoas simples e normais que buscam o seguimento radical de Cristo, entregando sua vida a Jesus, no cotidiano.
A pessoa, ao sentir o apelo do chamado à vida religiosa, começa um processo de discernimento e amadurecimento, realizado por meio de uma caminhada de conhecimento espiritual e humano. Desse modo, começa a viver “o grande tesouro na Igreja naqueles que seguem o Senhor de perto, professando os conselhos evangélicos” (votos de pobreza, de obediência e de castidade), em uma congregação religiosa (Papa Francisco, Oração do Ângelus, 2 fev. 2020). E nesse seguimento, esforça-se para ser “sal e luz” de Jesus por onde passar.
No decorrer do processo de formação do vocacionado, é necessário o acompanhamento e ser acolhido numa comunidade de vida religiosa, em busca de crescimento e amadurecimento nas dimensões espiritual, intelectual, comunitária, afetiva e apostólica. Essa ajuda e esforço será para aperfeiçoar as motivações que sustentam a vocação do candidato à vida religiosa. A vivência dessas dimensões estará presente na vida toda do consagrado, da consagrada.
Durante a formação, há também os estudos acadêmicos, necessários para proporcionar competência e qualificação exigidas na missão. Na atualidade, torna-se cada vez mais necessário formar solidamente a pessoa, para seguir Jesus nos mais vulneráveis e fragilizados, e tornar-se capaz de fazer conhecida a ação de Cristo, levando-o a ser conhecido e amado.
Toda vocação cristã é seguimento a Jesus Cristo, o que muda é o como. Portanto há diversas formas de segui-lo e servi-lo. Todo seguimento é vivido na missão em formas de vida diferentes: vocação ao matrimônio (família), vida sacerdotal e vida religiosa consagrada. Na vida religiosa, o vocacionado escolhe uma congregação que responda aos apelos do carisma e dons recebidos para sua vida e viver sua vocação. Ou seja, “Graças especiais entre os fiéis de todas as classes, as quais os tornam aptos e dispostos a tomar diversas obras e encargos, proveitosos para a renovação e cada vez mais ampla edificação da Igreja, segundo aquelas palavras” (Constituição Dogmática Lumen Gentium, n.º 12). Em outras palavras, o carisma é a missão concreta vivida com base no Evangelho, do qual são partes integrantes a promoção da justiça, do diálogo inter-religioso, no contato com a cultura moderna.
No seguimento à vida religiosa, são necessárias atitudes, valores e padrões de conduta que, em seu conjunto, constituem o que podemos chamar de pressupostos da vocação daqueles que desejam seguir o Cristo encarnado na condição dos pobres. Nesse caso, podemos elencar características ou pressupostos da vocação religiosa consagrada necessários no discernimento da vocação, tais como:
- Profundo amor pessoal a Jesus Cristo. A pessoa seguidora de Cristo nos pobres mais pobres é alguém que, embora pecadora, sente-se chamada a acompanhar os passos de Jesus. Dá de graça o que de graça recebeu: o dom do amor redentor de Cristo. Hoje, como sempre, é a profunda identificação pessoal com Jesus a principal característica da vocação.
- Contemplativos na ação. Seguir Jesus na pessoa dos mais pobres é sentir-se unido a Deus, pela salvação de todos. Deus atua nos acontecimentos e por meio das pessoas, no aqui e agora, e é no discernimento que o seguidor de Cristo assume a responsabilidade de suas decisões apostólicas, participa da missão do Senhor.
- Solidariedade com os mais necessitados. A pessoa seguidora de Cristo no pobre faz-se solidária com os pobres, os marginalizados e os sem vez e sem voz.
- Sempre em busca do bem maior. A pessoa seguidora de Cristo nos pobres mais pobres sente-se constantemente levada a descobrir onde está o mais necessitado. Para isso, é preciso que não se acomode com o já realizado e tenha uma audácia que a leve a novas fronteiras e a novos desafios. É a busca do bem maior que dá o dinamismo apostólico da missão.
Por fim, muito mais que todos os pressupostos para a vida religiosa, necessitamos contar com a responsabilidade e o respeito por parte de toda a comunidade cristã e religiosa. O convite “Vinde e vede” (João 1,39) de Jesus aos vocacionados e aos que estão em formação depende intrinsicamente do testemunho e da oração de todos, os já consagrados e de toda a comunidade cristã.
Padre Domingos Chagas, SJ
Monge eremita na Ermida São Miguel, em Maringá-PR.