Vocação batismal: Deus nos chama pelo nome

Desde 1981, a Igreja do Brasil celebra agosto como o Mês das Vocações. A ideia surgiu um pouco antes, pela proposta do notável bispo Dom Aloísio Lorscheider, na Diocese de Santo Ângelo (RS). Sob inspiração da eclesiologia do Concílio Vaticano II, há um cuidado de recordar o valor de todas as vocações cristãs: para os ministérios ordenados, para a vida em família, para a vida religiosa consagrada e para os ministérios leigos. É bom lembrar que a palavra “vocação”, de origem latina, significa “chamado”. Neste texto, eu gostaria de destacar nossa vocação de batizados, batizadas. 

O chamado que recebemos no batismo tem grande embasamento na Sagrada Escritura e no Magistério da Igreja. No dia em que somos banhados em Cristo, somos convocados, pelo nome, para seguir os passos de Jesus. É um chamado radical e permanente, uma nova identidade que molda toda a vida cristã. É uma pena que muitos não têm a mínima noção dessa graça. 

Um grande fundamento sobre a vocação batismal está na Constituição Dogmática Lumen Gentium (LG), uma das grandes obras do Concílio Vaticano II. Esse texto aborda a natureza e a missão da Igreja, e é nele que encontramos a compreensão mais completa do chamado universal à santidade. O número 10 distingue entre o sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial (dos presbíteros e bispos): “O sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial ou hierárquico, embora se diferenciem essencialmente e não apenas em grau, ordenam-se um ao outro, pois ambos, a seu modo peculiar, participam do sacerdócio único de Cristo”. 

 

Três grandes missões

 

Pelo batismo, todos os cristãos são enxertados na missão de Jesus, tornando-se coparticipantes de seu ofício de sacerdote, profeta e rei. Isso significa que, na vida cotidiana, o cristão, em sua essência, exerce seu sacerdócio comum ao oferecer a Deus “orações, ações de graças, testemunho de vida santa, abnegação e caridade, a fim de que todo o seu agir se torne sacrifício espiritual” (LG 34). A vocação batismal, portanto, é o chamado à santidade, a ser “santo como o Pai é santo” (Mateus 5,48), vivendo no mundo a vida de Cristo. 

A vocação profética é outro pilar da vocação batismal. Conforme a Lumen Gentium (n. 12), os fiéis, pelo batismo, são habilitados a testemunhar Cristo no mundo. São chamados a proclamar a Boa-Nova não apenas com palavras, mas principalmente com o exemplo de suas vidas. O profeta (palavra que significa “porta-voz”) é aquele que principalmente age (se precisar, fala) em nome do Senhor, denuncia as trevas, a morte, e anuncia as luzes, a vitória da vida, o reinado de Deus. Busca consolar, corrigir, aconselhar. Em um mundo muitas vezes descrente, a vocação profética do batizado é viver de tal modo que sua fé seja visível e atraente, despertando nos outros o desejo de conhecer Cristo. O testemunho de vida, a defesa da verdade e da justiça, a oposição àquilo que ofende a dignidade humana.

A terceira dimensão, a vocação régia, está ligada ao chamado a servir. Para a decepção de alguns “cristãos”, a realeza de Jesus não é exercida em tronos de ouro ou palácios, sob os ornamentos de coroas e cetros, mas no serviço e no amor, cujo ápice é a Cruz. “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Marcos 10,45). O batizado, portanto, é chamado a exercer seu ofício régio por meio do serviço aos irmãos, especialmente em favor daqueles mais vulneráveis. O exercício dessa realeza se manifesta na luta contra o pecado e as estruturas de injustiça no mundo, na prática da ecologia integral. Como explica o Catecismo da Igreja Católica, “Os fiéis leigos são chamados a impregnar o mundo com o espírito de Cristo”, participando ativamente na “ordenação das realidades temporais” (n. 908). Isso significa atuar na política, na economia, na cultura, na família, enfim, na defesa da natureza e do ser humano, buscando sempre o bem comum. A vocação régia, diga-se, válida para leigos e leigas, consagrados e consagradas, e ministros ordenados (cada um à sua maneira), é um chamado à responsabilidade e à transformação do mundo à luz do Evangelho.

 

Vocação batismal e família

 

Não por acaso, a vocação à vida familiar também é celebrada em agosto. Na Exortação Apostólica Familiaris Consortio, São João Paulo II descreve a família como “Igreja doméstica”, um espaço privilegiado em que a vocação batismal é vivida e transmitida. Os pais são os primeiros e principais educadores na fé de seus filhos, e é no seio da família que as crianças devem aprender a orar, a viver a caridade e a discernir a vontade de Deus. O matrimônio cristão é, em si, uma vocação batismal vivida em comunidade, um sacramento que fortalece os cônjuges para exercerem, no ambiente familiar e na sociedade, sua missão de sacerdotes, profetas e reis. 

A vocação batismal, em síntese, é um chamado amplo e transformador. É a entrada para uma nova vida em Cristo, que se manifesta concretamente, nas miudezas do cotidiano e em momentos fortes. Esse chamado não é uma opção, mas uma realidade do ser batizado. Exige uma resposta livre e consciente, que se renova a cada dia. Pelo batismo, todos nós somos chamados à santidade, à missão e ao serviço, a ecoar as palavras e os gestos Jesus.

 

Alessandro Faleiro Marques

Membro da Equipe de Comunicação SSpS Brasil, diácono na Arquidiocese de Belo Horizonte.

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