“Esperançar”, esse é o verbo a iluminar a espiritualidade do Advento, o tempo que abre o ano litúrgico e o ciclo do Natal. Diferente de “esperar”, o qual pode transmitir a ideia de uma pessoa parada, aguardando de modo passivo alguém ou alguma coisa, esperançar traz em si atitude.
Mas, afinal, os cristãos “esperam ativamente” o quê? Em resposta direta: aguardamos a segunda volta do Senhor. Isso é tão forte que é uma das bases do Credo católico: “E de novo há de vir, em sua glória, para julgar os vivos e os mortos; e o seu reino não terá fim”. Esperançando, esperamos por esse momento.
Este período do Advento nos convoca a “organizar a casa”, sempre vigilantes, com o coração atento para a chegada dessa pessoa tão importante e querida. É hora de lembrar que devemos estar acordados, porque Jesus parece ser indiferente a agendas e certas formalidades. Ele vem assim, a qualquer hora, porque é “de casa”, não uma visita.
Esperançamos praticando a compaixão, a divina arte de colocar-se no lugar do outro, sentir com o próximo as alegrias e as necessidades. Esperançamos ao antecipar, já neste mundo, um reinado não construído por nós (desculpem-me alguns amados compositores católicos), mas que vem a nós, dádiva de Deus, graça do Senhor. É o Reino, como nos ensinou Jesus, no qual não há espaço para injustiças, nem fome, nem situações de morte, nem dor, muito menos de desamor. Esperançamos ao viver, nas miudezas do cotidiano e nos momentos fortes da vida, como convém a batizados e batizadas: configurados a Cristo, revestidos do Senhor, encharcados de Jesus.
Hora de arranjar nossa consciência, abrir as janelas para entrarem a luz e a santa brisa, erguer-nos dos escombros de nossos pecados e jogar para longe o que nos rebaixa como seres humanos. Hora de tentar entender o motivo de, mesmo no meio de nós, discípulos e discípulas do Mestre que veio para servir (cf. Mt 20,28), haver tanta injustiça e pessoas relegadas à “segunda categoria”. Hora de questionar e agir.
O Advento nos recorda também uma delicadeza de Deus da qual costumamos nos esquecer. É Ele que vem a nosso encontro, que nos ama primeiro, que toma a iniciativa (cf. 1Jo 4,19). O Advento, portanto, não é apenas “preparação para o Natal” (na liturgia, esta é reservada para os últimos dias antes de 25 de dezembro), mas o adornar-se para o noivo que, transbordante de amor, vem correndo, saltando pelos montes (Ct 2,8).
Em uma era fortemente marcada por individualismo, fanatismo político e religioso, fundamentalismo e muitos outros “ismos”, esperançar é agir com firmeza e coragem. Para aguardar com dignidade o amabilíssimo Senhor, somos convocados a andar na “contramão” do sistema que nos joga no abismo, destrói a natureza, gera violência.
Em termos práticos, troquemos as quinquilharias que levam a dívidas e entopem nossas gavetas e nossa casa pelo dom da simplicidade. O impulso consumidor induzido por engenharias perversas dê lugar ao prestígio a pequenos comerciantes e artesãos. A gula e as medonhas ressacas cedam espaço à partilha e à alegria sincera e saudável. Não haja lugar vazio em nossas mesas nem em nossos espaços celebrativos. Afastemos de nossos assuntos, sobretudo nas ocasiões de convivência, os “graúdos” deste mundo, diabólicos geradores de divisão, e cedamos nosso ouvido às palavras de quem está ao nosso lado, para curar feridas, alegrar-se juntos.
Deus nos conceda a sabedoria de viver esta virtude cristã: a de esperançar. Um santo Advento a cada um, cada uma. Vinde logo, Senhor Jesus! Vinde caminhar com seu povo!
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Membro da Equipe de Comunicação SSpS Brasil e da Equipe de Espiritualidade da Província SSpS Brasil Norte, diácono na Arquidiocese de Belo Horizonte.