Nasci em 2 de novembro de 1954. Imaginem como era comemorado, há algumas décadas, o Dia de Finados… Dia de silêncio, de cores escuras e muita tristeza… Muitas famílias nem ligavam o rádio, quase não sorriam… Em minha infância, não tive festa de aniversário devido às dificuldades e também ao dia em que nasci.
Aos 7 anos, minha mãe comprou um bolo de padaria, daqueles bem simples, com um furo no meio, sem confeitos, só para lembrar meu aniversário. Foram convidadas algumas vizinhas para o momento. Acreditem: ninguém apareceu! Mas por quê? Era Dia de Finados! Dia dos Mortos! Como nossos falecidos eram lembrados com muita tristeza, com muita saudade, não era momento de manifestar alegria. Assim era há mais de meio século. No meio em que vivi, sentiam como se os mortos estavam em “um sono profundo”. Quantas vezes ouvimos dizer: “Ah, finalmente, descansou”. Esse não é o cenário nem a realidade para a qual Jesus nos criou.
“Ele enxugará dos seus olhos toda lágrima. Não haverá mais morte nem tristeza, nem choro, nem dor, pois a antiga ordem já passou” (Apocalipse 21,4).
A morte é um momento de tristeza, de lamento. É um momento muito duro em nossa trajetória, mas Cristo nos deu uma mensagem de esperança: “Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: ‘Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o Reino que vos está preparado desde a fundação do mundo’” (Mateus 25,34).
A vida é transformada pelo amor misericordioso de Deus. Vejam com atenção as palavras do Pe. Anísio Tavares, missionário redentorista:
A celebração leva a compreender o amor de Deus por todos. São filhos e filhas amados, criados segundo a sua imagem e semelhança. Foi por amor e para o amor que Ele deu o dom da vida. Viver bem e em plenitude é o desejo que o Criador tem para todos e cada um de nós.
Continuemos a refletir… O momento de viver o luto de um ente querido nos faz perceber que o amor de Deus é ainda maior do que imaginamos. Vida e morte são dois grandes mistérios que ultrapassam nossa compreensão. O nascimento e o falecimento nos levam a fazer as três perguntas: de onde viemos? Onde estamos? Para onde vamos? “Nossa origem e nosso destino é o coração de Deus. Nele, temos a plenitude da vida”, explica Pe. Anísio Tavares.
Estes temas: Cruz, sofrimento, saudades, tristeza e vida me fizeram ler mais, pesquisar, conversar, buscar, partilhar para perceber a verdadeira luz que descobriremos nos momentos de viver nossas cruzes. Olhem o que o Catecismo da Igreja Católica (cân. 1680) declara:
Todos os sacramentos, principalmente os da iniciação cristã, tem por fim a última páscoa do cristão, que, pela morte, o faz entrar na vida do Reino. Então se cumpre o que ele confessa na fé e na esperança: “Espero a ressurreição dos mortos e a vida do mundo que há de vir”.
“O mundo que há de vir…” Vamos continuar em nossa reflexão… Seguindo a leitura do Catecismo, encontramos, no cânone 1681:
O sentido cristão da morte é revelado à luz do mistério pascal da morte e ressurreição de Cristo, em quem pomos a nossa única esperança. O cristão que morre em Cristo Jesus “abandona este corpo para ir morar junto do Senhor” (2 Coríntios 5,8).
“Saudade sim, tristeza não.” Essa frase de Santo Agostinho nos ensina que o tempo que nos separa da presença de nossos entes queridos traz a saudade que é natural. Padre Marcelo Rossi repete sempre essa passagem, lembrando a todo cristão essa verdade.
Desde o início da Igreja, já havia o costume de celebrar e rezar pelos mortos, pedindo a misericórdia de Deus para os que partiram.
Por sua morte e ressurreição, Jesus Cristo “nos abriu” o céu. A vida dos bem-aventurados consiste na posse em plenitude dos frutos da redenção operada por Cristo, que associou à sua glorificação celeste os que creram nele e que ficaram fiéis à sua vontade. O céu é a comunidade bem-aventurada de todos os que estão perfeitamente incorporados a Ele (Catecismo da Igreja Católica, cân. 1026).
Somente a fé verdadeira é capaz de dar um novo significado a toda a nossa vida. Como diz o texto do Evangelho de João (6,35): “Quem vem a mim não terá mais fome, e quem crê em mim nunca mais terá sede”. São promessas de Jesus como em João (6,47): “Em verdade, em verdade vos digo que aquele que crê em mim tem a vida eterna”. Por isso tudo, que nossa vida se encha de esperança e sempre rezemos por nossos irmãos que partiram desta vida.
Para o cristão, a morte é o início de uma nova etapa. Embora a tristeza nos domine quando perdemos um ente querido, a esperança nos consola, pois, como rezamos na liturgia, “Para os que creem, a vida não é tirada, mas transformada; e desfeito o nosso corpo mortal, nos é dado, nos céus, um corpo imperecível”. A fé na ressurreição encoraja nosso viver e nos impulsiona à prática do bem, deixando-nos conduzir pelo Espírito Santo.
Na Profissão de Fé rezamos: creio na ressurreição, creio na vida eterna. Que essa fé nos impulsione na caminhada até Deus, seguindo os ensinamentos de Jesus Cristo. Assim construiremos uma vida feliz que se realizará, de forma plena e perfeita, após a morte, quando seremos envolvidos pelo abraço amoroso de nosso Pai. Todos morreremos, mas somos chamados à ressurreição por Cristo. Por isso, o Dia de Finados é um convite a celebrarmos a vida e a esperança!
Maria Fernanda P. Azevedo
Missionária leiga de Deus Uno e Trino, Rio de Janeiro.