“Com coração de pai”: um grande louvor a São José

Em 19 de março, celebramos a Solenidade de São José, patrono universal da Igreja, título que o Esposo de Maria recebeu em 8 de dezembro de 1870, pelo Bem-Aventurado Papa Pio IX. Para marcar os 150 anos dessa proclamação, o Papa Francisco convocou um ano especial dedicado ao Patriarca de Nazaré, a ser comorado até 8 de dezembro de 2021, e publicou a Carta Apostólica Patris Corde (“Com coração de pai”, em tradução livre), assinada em 8 de dezembro de 2020.

A devoção a São José pode ser considerada mais uma das grandes características do atual pontificado. Por uma feliz providência, o início oficial do ministério do Papa Francisco deu-se exatamente em 19 de março de 2013. Um de seus simpáticos costumes é colocar debaixo de uma imagem de São José dormindo algumas anotações sobre temas difíceis, que pedem melhor discernimento, como explicou o próprio Papa. Desde então, a curiosa figura do santo dormindo é uma das lembranças mais procuradas tanto nos arredores da Praça São Pedro, no Vaticano, quanto em lojas especializadas em artigos religiosos ao redor do mundo.

A mensagem de Patris Corde quer mais dirigir um grande louvor a São José, homem discreto, mas exemplar, que ajudou a proteger e a formar a personalidade humana de Jesus. Francisco desejou partilhar algumas reflexões pessoais sobre aquele a quem denomina de uma “figura extraordinária, tão próxima da condição humana de cada um de nós”.

“Depois de Maria, a Mãe de Deus, nenhum santo ocupa tanto espaço no magistério pontifício como José, seu esposo”, explica. Assim, o Papa destaca que o Bem-Aventurado Pio IX declarou São José como “Padroeiro da Igreja Católica” (1870); o Venerável Pio XII o apresentou como “Padroeiro dos Operários” (1955); e São João Paulo II o proclamou como “Guardião do Redentor” (1989). Francisco lembra que o povo também invoca o pai adotivo de Jesus como “Padroeiro da Boa Morte” (Catecismo da Igreja Católica, cân. 1014).

O texto do Pontífice sublinha sete atributos de São José: Pai amado, Pai na ternura, Pai na obediência, Pai no acolhimento, Pai com coragem criativa, Pai trabalhador, Pai na sombra. Sobre cada um, o Papa expõe meditações para reafirmar que, em sua atitude silenciosa, aquele homem deixa importantes exemplos a guiarem os cristãos no seguimento de Jesus. “São José lembra-nos de que todos aqueles que estão, aparentemente, escondidos ou em segundo plano têm um protagonismo sem paralelo na história da salvação”, diz Francisco, em tom de reconhecimento e de gratidão.

Homem de fé

Em Patris Corde, Francisco destaca uma atitude de José que intriga muitos de nós, homens, sobretudo quem vive o matrimônio. O Carpinteiro de Nazaré aceita Maria, mesmo tendo uma imensa angústia ante a gravidez incompreensível da noiva. Que situação complicada! Talvez possamos ter uma ideia do tamanho da decepção a invadir o coração de José! Contudo aquele operário decide não difamar Maria (o que poderia levá-la a punições indizíveis), mas, de modo secreto, deixa a gestante (veja o primeiro capítulo do Evangelho de Mateus).

Mais surpreendente ainda é a fé do Patriarca. Ele dá crédito à mensagem de Deus, representado por um anjo, que lhe fala em sonho: “José, filho de Davi, não tenhas medo de receber Maria como tua esposa, porque ela concebeu pela ação do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, e tu lhe darás o nome de Jesus, pois ele vai salvar o seu povo dos seus pecados” (Mateus 1,20-21). Justificativa difícil! Mas José acredita! Daí podemos inferir que esse trabalhador é um homem de oração, atento à voz de Deus; um gigante na fé. “Quando acordou, José fez conforme o anjo do Senhor havia mandado” (Mateus 1,24). Segundo o Papa Francisco, “José acolhe Maria, sem colocar condições prévias. Confia nas palavras do anjo”. O Pontífice completa: “Com a obediência, [José] superou o seu drama e salvou Maria”.

“Hoje, neste mundo onde é patente a violência psicológica, verbal e física contra a mulher, José apresenta-se como figura de homem respeitoso, delicado, que, mesmo não dispondo de todas as informações, decide-se pela honra, dignidade e vida de Maria. E, em sua dúvida sobre o melhor a fazer, Deus o ajudou a escolher iluminando seu discernimento” (homilia em Villavicencio, Colômbia, 8 de setembro de 2017).

Francisco faz outra observação interessante: tal como Maria, na Anunciação (solenidade celebrada uma semana depois, em 25 de março), e Jesus, no Getsêmani (Marcos 14,36), ao longo da vida, “José soube pronunciar o seu ‘fiat’” (“que se faça”). Um “sim” dado nos desafios do cotidiano de uma família pobre, que vivia em uma periferia e tinha de lutar muito para sobreviver, tal como vemos muitas em nosso tempo.

“A Sagrada Família teve que enfrentar problemas concretos, como todas as outras famílias, como muitos dos nossos irmãos migrantes que ainda hoje arriscam a vida atormentados pelas desventuras e a fome. Nesse sentido, creio que São José seja verdadeiramente um padroeiro especial para quantos têm de deixar sua terra por causa das guerras, do ódio, da perseguição e da miséria”, diz o Papa.
Na Carta Apostólica, o bispo de Roma chama a atenção para um dado dos evangelhos que pode passar despercebido. Ao fim de cada passagem na qual José é protagonista, vê-se “que ele se levanta, toma consigo o Menino e sua mãe, e faz o que Deus lhe ordenou” (cf. Mateus 1,24; 2,14.21).

O dom da paternidade

Para o Papa Francisco sempre que alguém assume a responsabilidade pela vida de outra pessoa, em certo sentido, exercita a paternidade em relação a esta. “Não se nasce pai, torna-se tal… E não se torna pai apenas porque se colocou no mundo um filho, mas porque se cuida responsavelmente dele”, completa.

A Carta Patris Corde encerra-se com uma singela prece, bem ao estilo de Francisco e do Padroeiro da Igreja:

“Salve, guardião do Redentor
e esposo da Virgem Maria!
A vós Deus confiou seu Filho;
em vós, Maria depositou sua confiança;
convosco, Cristo tornou-se homem.

Ó Bem-aventurado José, mostrai-vos pai também para nós
e guiai-nos no caminho da vida.
Alcançai-nos graça, misericórdia e coragem,
e defendei-nos de todo o mal. Amém.”

Que São José, modelo de trabalhador, esposo, pai e seguidor de Jesus, Padroeiro da Igreja, rogue a Deus por nós!

Alessandro Faleiro Marques
Diácono permanente na Arquidiocese de Belo Horizonte, professor, editor de textos para as irmãs missionárias servas do Espírito Santo.

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