O cuidado efetivo da casa comum exige mudar nosso estilo de vida

Cuidar é envolver-se afetivamente com algo que vai além de nós, abarcando as dimensões da esfera pessoal, social, ecológica e espiritual. O ser humano é o único ser que necessita do cuidado do outro, desde o início de sua vida até seu último suspiro [1]. Na mitologia greco-romana, o Mito do Cuidado já nos apontava isso: “Mas como você, Cuidado, foi quem, por primeiro, moldou a criatura (ser humano), ficará sob seus cuidados enquanto ela viver”. O cuidado é um parâmetro para se compreender o que é humano. O ato de cuidar é um aprendizado contínuo.

Seguindo esse mesmo caminho do cuidado como balizador de nossas atitudes, no ano de 2015, o Papa Francisco publicou a encíclica Laudato si’,que, a meu ver, é a mais icônica dos últimos tempos. Nela Francisco entrega a todos o coração do seu pontificado: a ecologia integral, o cuidado da casa comum.

Ecologia integral não se refere apenas ao meio ambiente, mas inclui aquelas dimensões já mencionadas no início de nosso texto: pessoal, social, ecológica e espiritual. Para Francisco, tudo está interligado e, assim sendo, propõe a nós uma nova maneira de entender esse entrelaçar de vidas de todas as criaturas do planeta. A proposta do Papa Francisco se aproxima muito da filosofia do bem viver, presente na vida dos povos originários da América Latina: a reciprocidade entre as pessoas, a amizade fraterna, a convivência com os outros seres da natureza e o profundo respeito pela terra [2]. Francisco resgata essa herança que nós, latino-americanos, recebemos dos povos indígenas e a reelabora escrevendo a chamada “Encíclica Verde”.

Três anos após publicar a Laudato si’, Francisco lança a encíclica Fratelli tutti, que fala sobre a fraternidade e a amizade social, indicando que primeiro precisamos nos entender como irmãos, habitantes de uma casa comum para, aí sim, trabalharmos juntos e eficazmente pelo bem de todos. E, como já era de se esperar, como um bom jesuíta que é, assumiu e convidou todos nós a abraçar o Pacto Educativo Global, que não é a solução dos nossos problemas, mas é o caminho. Como ele mesmo fala: “Porque toda mudança precisa de um caminho educativo para fazer surgir uma nova solidariedade universal e uma sociedade acolhedora” [3]. A educação é o caminho.

Somos chamados a educar o pensar, educar o olhar, educar o sentir, educar o ouvir, educar o falar… Tudo em nós precisa ser educado para podermos atingir a plenitude a que somos chamados. Entre tantos significados sobre educar que encontramos, cito este: “dar (a alguém) todos os cuidados necessários ao pleno desenvolvimento da sua personalidade”. Com o Pacto Educativo Global, o Papa Francisco nos aponta um caminho para que possamos cuidar da educação e passemos a agir. Ele nos convida a uma verdadeira conversão, no sentido mais estrito da palavra, metanoia, mudança de pensamento, de sentimento que leva a uma verdadeira mudança de atitude. Conforme educamos e somos educados, vamos adquirindo novos hábitos, refletindo nossas atitudes e, quando percebemos, estamos mudando nosso estilo de vida.

Finalizo com o pensamento de Hannah Arendt sobre a educação: “A educação é o momento que decide se nós amamos suficientemente o mundo para assumir a responsabilidade e assim salvá-lo da ruína, que é inevitável sem a renovação, sem a chegada de novos seres, de jovens. Na educação decide-se também se nós amamos tanto os nossos filhos a ponto de não os desalojar do nosso mundo, deixando-os à mercê de si mesmos, a ponto de não arrebatar de suas mãos a possibilidade de realizar algo novo, algo de imprevisível para nós, e prepará-los, em vez disso, para a tarefa de renovar um mundo que será comum a todos”.

Referências
[1] Ruth Cavalcante. O afeto e a arte de cuidar.
[2] Disponível em: https://cimi.org.br/o-bem-viver-indigena-e-o-futuro-da-humanidade/
[3] Mensagem do Papa Francisco para o lançamento do pacto educativo.


Alexandre Britto
Coordenador missionário do Colégio Imaculado Coração de Maria, Rio de Janeiro-RJ.

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