Sabedoria indígena em terras amazônicas 

Em preparação ao Sínodo da Amazônia, que será realizado em outubro, estamos publicando uma série de artigos que nos ajudam a conhecer um pouco da realidade pan-amazônica e compreender a importância do sínodo para a Igreja Católica, os povos amazônicos e a sociedade em geral.

O documento preparatório “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e uma ecologia integral” está organizado em três partes, seguindo o método “ver, julgar (discernir) e agir”. Já apresentamos uma síntese sobre a primeira parte do ver (https://blog.ssps.org.br/diversidade-cultural-e-ambiental-da-pan-amazonia) e, agora, publicamos sucintamente a segunda parte, que fala sobre a história eclesial, direito dos povos e sua sabedoria.

Memória histórica 

A presença humana na Pan-Amazônia tem mais de 10 mil anos, quando o território passou a ser habitado por diferentes povos, incluindo as principais civilizações pré-colombianas. Com o processo de ocupação colonial de Portugal e da Espanha, a partir de 1500 d.C., estes povos sofreram “um agigantado processo de dominações”, cheio de “contradições e dilacerações”, conforme reconhece o Documento de Puebla (DP 6).

O próprio documento preparatório do Sínodo afirma: “Lamentavelmente, ainda hoje, existem restos do projeto colonizador que criou manifestações de inferiorização e demonização das culturas indígenas”. A consequência disso é o enfraquecimento das estruturas sociais indígenas e o desprezo de seus saberes e de sua expressão.

Os 400 anos de missão e evangelização passaram pelas contradições da mentalidade colonizadora e, apesar dos cerca de 200 anos de independência dos países da Pan-Amazônia, “processos semelhantes continuam se alastrando sobre o território e seus habitantes, hoje vítimas de um novo colonialismo feroz com máscara de progresso”. Essa realidade levou o Papa Francisco a afirmar, em Puerto Maldonado, que, “provavelmente, nunca os povos originários amazônicos estiveram tão ameaçados nos seus territórios como estão agora”.


Direito dos povos

Em visita a Puerto Maldonado, o Papa Francisco falou que a Amazônia é vista como despensa de recursos naturais, sem levar em conta seus habitantes. As relações harmoniosas entre o Deus Criador, os seres humanos e a natureza foram quebradas pelas consequências nocivas do neoextrativismo de recursos como petróleo, gás, madeira e ouro, e pelos megaprojetos, como hidrelétricas, eixos viários e monoculturas agroindustriais.

Francisco denunciou o modelo de desenvolvimento anônimo, obcecado pelo consumismo que transforma o “planeta num lixão”. Os novos colonialismos ideológicos, em nome do progresso, destroem as identidades culturais indígenas, portadoras de sabedoria ancestral de relação harmoniosa com a natureza. Além disso, segundo o Papa, há também políticas perversas de conservação da natureza que não levam em conta seus habitantes, que também têm direito ao desenvolvimento social e cultural. 

O direito ao território dos povos indígenas, campesinos e outros setores populares ainda gira em torno da falta de regularização de terras e de reconhecimento de suas propriedades ancestrais e coletivas, sem articular a dimensão cultural e a cosmovisão dessas comunidades. Para a Igreja, “Proteger os povos indígenas e seus territórios é uma exigência ética fundamental e um compromisso básico dos direitos humanos”, o que está de acordo com o enfoque da “ecologia integral” da encíclica Laudato Si’ (cf. LS, cap IV).

Espiritualidade e sabedoria 

  Na região amazônica, os povos indígenas buscam a sabedoria do bem viver, o que significa estar em comunhão com as outras pessoas, com o mundo, os seres em seu entorno e com o Criador, o que somente será alcançado “quando se realizar o projeto comunitário em defesa da vida, do mundo e de todos os seres vivos”.

Dentro da grande diversidade cultural e religiosa, as comunidades são chamadas a se unir em defesa da vida e cuidar da Casa Comum. As famílias, como instituição social, têm dado uma grande contribuição para manter vivas as culturas. Mas há também a presença de algumas seitas motivadas por outros interesses que nem sempre favorecem uma ecologia integral.

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