Setembro Amarelo: “Onde está o teu irmão?”

Em Êxodo, capítulo 4, versículo 9, Deus pergunta a Caim: “Onde está o teu irmão Abel?”. Caim responde: “Não sei. Acaso sou guarda do meu irmão?”. Este é o mês conhecido como “Setembro Amarelo”, tempo de campanha de prevenção e discussão sobre o suicídio e as tentativas de suicídio. Neste artigo, vamos refletir sobre o cuidado com o outro, tendo como referência a orientação bíblica, visto que este também é o mês dedicado à Bíblia.

Nossa cultura moderna tem nos acostumado a não interferir na vida do outro, em seus problemas. Algumas frases repetidas no cotidiano traduzem essa ideia: “não se meter onde não é chamado”, “o problema é dele”, “cada um cuide de sua vida”, “em briga de marido e mulher, não se mete a colher”, “cada um com seus problemas”, etc. No entanto, contraditoriamente, quando acontece um suicídio, muitas vezes, ouve-se: “por que ele/ela não pediu ajuda?”, “ah! Se eu tivesse prestado atenção aos sinais”, “como eu não percebi!?”… Aí é tarde demais.

No fim de semana de 10 de setembro, dia especial da prevenção ao suicídio, coincidentemente, as leituras bíblicas da celebração da Palavra e da missa na Igreja Católica tinham como tema o cuidado com o irmão. Um trecho da primeira leitura, tirada do livro de Ezequiel (33,8), afirmava: “Se eu disse ao ímpio que vai morrer, e tu não lhe falares, advertindo-o a respeito da sua conduta, o ímpio vai morrer por própria culpa, mas eu te pedirei contas de sua morte”. 

Semelhante a isso, no Evangelho do dia, em Mateus (18,15-20), Jesus falava da correção fraterna. Para ganhar o irmão (não ganhar do irmão), há três passos: chamá-lo em particular; depois pedir a ajuda de outras pessoas; depois ainda, da comunidade, com o objetivo de alertá-lo a respeito da maneira como está conduzindo a vida. Antes de excluí-lo ou condená-lo, tentar, de forma criativa, recuperá-lo. Esgotadas todas as tentativas, respeita-se o princípio do livre-arbítrio. 

Apesar de a mensagem do profeta Ezequiel não dever ser levada ao pé da letra, pois o contexto da leitura é o cuidado com a nação, com o comportamento do povo de Israel, dos exilados e dos que ficaram em Jerusalém; embora não se possa reduzi-la e direcioná-la a uma pessoa específica, ainda assim, ela nos ajuda a refletir sobre o cuidado com o próximo.

Imagem by Istock

Nossa postura diante dos problemas do irmão, de acordo com as reflexões bíblicas, não tem o caráter de invasão de privacidade ou de intromissão, como pode parecer à primeira vista. Isso porque a iniciativa, nesse caso, tem como objetivo ganhar o irmão para o convívio harmonioso com a comunidade, com a família e com a sociedade, ajudá-lo a superar o sofrimento. O problema é que se confunde essa ajuda com outros interesses maléficos. Há pessoas que se aproximam dos outros com “a melhor das intenções”. No entanto, revelam-se com interesses egoístas, narcisistas, dominadores. 

Muitas vezes, o conteúdo do outro vira objeto de fofoca, intrigas e exposição do próximo. Pessoas se apresentam como modelos a serem seguidos. Muitas vezes, há ainda cobranças, comparações, pressões, humilhações. Daí surge a barreira em pedir ou aceitar ajuda.

Embora os grupos de terapia como alcoólicos anônimos, de dependentes químicos e a psicoterapia exigem que a iniciativa de pedir ajuda tenha de partir de cada pessoa, devemos encontrar uma forma de estarmos atentos ao cuidado com o próximo. Afirma o grande Mestre: “Se dois de vocês estiverem de acordo na terra sobre qualquer coisa que quiserem pedir, isso lhes será concedido por meu Pai que está nos céus” (Mateus 18,19). Ainda: “Irmãos, não fiqueis devendo nada a ninguém, a não ser no amor mútuo, pois quem ama o próximo está cumprindo a Lei” (Romanos 13,8).

Aparecido Luiz de Souza, SVD

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